MANAUS – Cotado para disputar as eleições presidenciais de 2022 pelo PT, o ex-presidente Lula declarou nesta sexta-feira (28) ser favorável às obras de recuperação da rodovia BR-319. “Quero dizer publicamente: sou favorável à construção da rodovia. Se a gente tiver pensando em crescimento, em desenvolvimento, tanto do estado de Rondônia quanto do Amazonas, você tem que ter a rodovia”, disse. A declaração foi dada em entrevista à rádio Tiradentes, de Manaus, nesta manhã.
Construída no Regime Militar, na década de 1970, a rodovia foi abandonada nos anos seguintes e ficou intransitável. Os governos de Lula e Dilma Rousseff retomaram as obras, mas nunca conseguiram entregar por completo a rodovia por questões ambientais. Estudiosos dizem que recuperação asfáltica vai gerar uma reação em cadeia de desmatamento naquela região, principalmente no Trecho do Meio, ainda preservada.
Aos jornalistas Ronaldo Tiradentes e Neuton Corrêa, Lula disse que, quando presidente, participou diretamente de muitas discussões sobre a BR-319 e defendeu que é preciso encontrar um ponto de equilíbrio entre as questões ambientais e do desenvolvimento socioeconômico envoltas no tema.
“O que você levar em conta é o seguinte: é possível construir a rodovia controlando toda a fúria de alguns empresários que querem desmatar sem nenhum critério, se a gente preservar tudo que é possível preservar? Eu acho que é. Acho que é”, afirmou.
“Eu, quando o Alfredo (Nascimento) era ministro (dos Transportes), houve várias discussões entre o ministro Alfredo e o ministro Minc (Carlos, do Meio Ambiente) para que se encontrasse um denominador comum que pudesse fazer aquela estrada, porque depois que nós fizemos a ponte no rio Negro era preciso fazer a estrada, era preciso fazer a ponte no rio Madeira [que me parece que está pronta]. Era preciso”, completou.
Lula disse que o entrave para a construção é de natureza ambiental. “A 319 se transformou como um problema, como um conflito no Oriente Médio. Sabe? Parece que as pessoas não querem sentar em torno de uma mesa e falar o seguinte: é possível fazer? É possível preservar?”, disse.
O ex-presidente defendeu que é preciso cuidar de todas as questões ambientais que forem necessárias para permitir a manutenção da BR como “uma rodovia ambientalmente correta”.
“Eu sou favorável (à recuperação da 319) e quero dizer ao povo do Amazonas que nós precisamos rediscutir essa estrada, fazer um acordo entre o pessoal do meio ambiente e o pessoal da engenharia para que a gente possa concluir essa estrada a bem do povo da região”, concluiu.
Meio ambiente, economia, soberania e povos indígenas
Na entrevista, o ex-presidente e provável candidato disse que não discute a Amazônia “como um santuário da humanidade”. “A Amazônia, ela tem que ser preservada porque a biodiversidade é um potencial extraordinário de desenvolvimento de um novo tipo de indústria no mundo, a indústria fármaca. Eu acho que não estamos explorando corretamente isso”, disse.
Lula criticou o tratamento ideológico de “entregar” a região aos Estados Unidos ou que a França quer “ser dona” da floresta. “Ninguém é dono da Amazônia. A Amazônia é um território soberano do Brasil”, afirmou.
O petista lembrou que em seu governo foi assinado o acordo com a Alemanha e a Noruega que garantiram a criação do Fundo Amazônia e que, no período, conseguiu reduzir em 80% o desmatamento.
Em outro trecho da entrevista, Lula pregou elevar o nível do debate ambiental no Brasil, que segundo ele carece de seriedade. Ele reforçou sua visão da Amazônia como um potencial econômico a ser explorado.
“É preciso parar com essa loucura de que não pode ter desenvolvimento na Amazônia, que é preciso preservar a Amazônia. Nós temos que fazer uma discussão séria. Primeiro, o povo da Amazônia são quase 25 milhões de pessoas que que vivem nessa região. O povo tem o direito de ter os bens materiais que toda e qualquer pessoa em qualquer lugar do Brasil e do mundo. Mas, ao mesmo tempo, você precisa saber que você não precisa degradar a floresta porque ela tem uma riqueza ainda não explorada por nós, que é a riqueza da nossa biodiversidade, que pode fazer uma revolução na indústria, na produção de remédio, de coisas importantes para o povo brasileiro, que nós precisamos saber explorar isso. Então, é preciso que a gente cuide do desenvolvimento da floresta, mas a gente cuide do desenvolvimento também industrial, comercial para garantir ao povo de forma ambientalmente justa. Você não precisa destruir a natureza para fazer desenvolvimento”, declarou.
Para equalizar as questões, ele disse que é preciso haver discussão em que não haja xingamentos, na qual estejam sentados à mesa todos os atores envolvidos. Pregou também aliança com outros países.
“Nós temos que compartilhar com o mundo a riqueza da biodiversidade, a exploração científica da riqueza que nós temos aí”, disse.
Lula declarou ainda que “os indígenas não são intrusos”. “Os intrusos somos nós”, emendou. Segundo ele, a demarcação de Terras Indígenas não deve ser vista como algo anormal.