MANAUS – Além de apontar a existência de violação de Direitos Humanos de moradores do Monte Horebe durante a desocupação promovida pelo Governo do Estado, o relatório do Ministério Público do Amazonas (MP-AM) tornado público nesta quarta-feira (11) pelo deputado estadual Dermilson Chagas (sem partido) também afirma que a Defensoria Pública do Amazonas (DPE-AM) “agiu de forma contrária aos interesses daqueles que tem por dever constitucional defender”.
O relatório, datado de 9 de março, é assinado pelo promotor Antonio José Mancilha, da 57ª Promotoria de Justiça de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania, que visitou o local, na Zona Norte de Manaus, na última sexta-feira (6), juntamente com Dermilson e representantes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Segundo o promotor, a defensoria firmou acordo aceitando a pretensão da Superintendência Estadual de Habitação (Suhab) de retirada imediata das famílias carentes “com o auxílio apenas de promessas do Estado do Amazonas” e sem consultar ou realizar qualquer tipo de audiência pública com os moradores.
Ele observou também que o Ministério Público deixou de participar do acordo judicial firmado entre a Suhab e a DPE-AM porque havia se manifestado anteriormente que acreditava se tratar de uma ação de direito individual e de natureza meramente patrimonial. “[…] o que, presentemente, a meu sentir, não resta evidenciado, uma vez que a reintegração afeta o contingente de número considerável de pessoas, em situação de vulnerabilidade social, econômica e jurídica em flagrante violação a direitos fundamentais, de natureza coletiva, difusa e individuais indisponíveis e homogêneos”, opinou Mancilha.
O relatório será entregue para Procuradora-Geral de Justiça do MP-AM para que providências possam ser tomadas.
Em nota encaminhada pelo defensor Rafael Barbosa, titular da Defensoria Especializada em Atendimento de Interesses Coletivos (DPEAIC), o órgão disse que a afirmação do promotor Antonio Mancilha de que a DPE-AM se posicionou favoravelmente à reintegração baseando-se “apenas em promessas” do governo ofende a Justiça, pois o acordo foi homologado judicialmente após análise minuciosa do juiz Ronnie Frank Torres Stone.
A nota ressalta ainda que a decisão do MP-AM se deu no início da ação e que a DPE-AM respeita a decisão do órgão, que “tem total independência para avaliar e decidir sobre sua permanência ou não em determinados processos”.
Já o MP-AM informou que o relatório de Mancilha não é um documento conclusivo, que a questão processual da reintegração já está judicializada e que continuará fiscalizando o cumprimento da lei e a defesa dos direitos coletivos e difusos da sociedade.
Confira as notas na íntegra:
Defensoria Pública
A respeito do relatório produzido pelo promotor Antônio José Macilha, e divulgado pela imprensa, que trata da reintegração de posse realizada na semana passada, na comunidade Monte Horebe, a Defensoria Pública do Estado do Amazonas (DPE-AM) tem a esclarecer que:
- Ao assinar um acordo que garante a mais de duas mil famílias da comunidade Monte Horebe o valor de R$ 600, como aluguel social, até a solução definitiva de moradia para cada uma delas, a Defensoria Pública do Estado do Amazonas (DPE-AM) demonstra, de forma evidente, que cumpre a sua missão institucional de velar pela proteção dos direitos e interesses das pessoas vulneráveis, propósito do qual jamais se afastará.
- A afirmação do promotor Antônio José Macilha, no sentido de que a DPE-AM se posicionou favoravelmente à reintegração baseando-se “apenas em promessas” do Poder Executivo, ofende a eficácia do título executivo judicial e o próprio Poder Judiciário, uma vez que o acordo foi homologado pelo magistrado Ronnie Frank Torres Stone, em fevereiro deste ano, após análise minuciosa.
- O relatório do promotor reconhece que os moradores do Monte Horebe são “pessoas em situação de vulnerabilidade social, econômica e jurídica”. É exatamente por esse motivo que a Defensoria atua nesse processo desde 2017, cumprindo, portanto, com o seu dever constitucional.
- O Ministério Público foi chamado para atuar na ação, desde o seu nascedouro, mas, como se confere no processo, não viu interesse público em atuar no feito. A Defensoria entende que o órgão tem total independência para avaliar e decidir sobre sua permanência ou não em determinados processos, como é o caso da ação em curso.
- Como fora amplamente divulgado pela imprensa, a Defensoria atuou para resguardar todos os direitos individuais dos moradores do Monte Horebe, requerendo do governo do Estado, por exemplo, a disponibilização de carros-pipa, o que foi atendido, e exigindo respostas da concessionária de energia, no que diz respeito ao corte de luz na comunidade. A concessionária de energia, por meio da nota CTA-DC Nº 152/2020, justificou que a interrupção de energia ocorreu para resguardar a vida dos próprios moradores e evitar possíveis mortes por descargas elétricas, ante à exposição de fios.
- O atendimento da Defensoria aos moradores que não assinaram na semana passada o acordo para a concessão do aluguel social foi reiniciado oficialmente nesta quarta-feira (11) – e não será na sexta-feira (13), como diz o relatório. Apesar disso, todas as famílias que procuraram a Defensoria Especializada em Atendimentos de Interesses Coletivos, na segunda e terça-feira, foram atendidas, sem exceção.
- Vale salientar que é dever da Defensoria Pública lutar para proteger e proporcionar vida digna aos mais vulneráveis, a fim de garantir o acesso e o exercício dos direitos fundamentais, como o direito à moradia. Neste caso, a DPE-AM se regozija em colaborar, através do acordo firmado perante a Justiça, para a conquista de moradia digna e adequada para mais de duas mil famílias.
- Por último, é importante lembrar que causas como a do Monte Horebe fazem parte do cotidiano da Defensoria, tenha ou não repercussão na mídia. Entre 2017 e 2019, 1,6 milhão de vulneráveis foram atendidos pela Defensoria, prova de que a instituição verdadeiramente se importa com aqueles que mais precisam.
Ministério Público
O Ministério Público informa que o relatório citado em matéria jornalística sobre a invasão denominada Monte Horebe faz parte do acompanhamento ordinário que vem sendo feito por várias promotorias, em particular, as de Meio Ambiente e Direitos Humanos. Dessa forma, esclarece que o conteúdo do referido documento não é conclusivo, servindo de base para o trabalho das promotorias especializadas e ciência da Procuradora-Geral de Justiça. E, considerando que a questão está judicializada, qualquer questionamento sobre o cumprimento da decisão judicial que determinou a desocupação da área deve ser feito perante o juízo. O Ministério Público informa, também, que continuará fiscalizando o cumprimento da lei e a defesa dos direitos coletivos e difusos da sociedade.