MANAUS – A Polícia Federal (PF) indiciou o empresário e irmão do senador Omar Aziz (PSD), Murad Aziz, o advogado e ex-presidente da Cigás, Lino Chíxaro, e mais 14 pessoas no inquérito oriundo da operação “Cashback”, 4ª fase da operação “Maus Caminhos”.
Para o delegado federal responsável pelo inquérito, Alexandre Teixeira dos Santos, as provas colhidas até aqui mostram elementos de convicção de que os investigados cometeram crimes como peculato (desvio de dinheiro público), lavagem de dinheiro, organização criminosa, extorsão e fraude em licitação.
A “Maus Caminhos” apura a ação de um grupo formado por empresários e agentes públicos que, segundo o Ministério Público Federal (MPF) e a Polícia Federal, reunido em uma organização criminosa, desviou mais de R$ 100 milhões de recursos estaduais e federais destinados ao setor da saúde no Amazonas. Os crimes teriam sido praticados entre os anos de 2014 e 2016.
A fase denominada “Cashback”, executada em outubro de 2018, teve como alvos empresários e advogados, cujos negócios com empresas ligadas ao esquema lhes renderam, entre 2014 e 2016, R$ 29,2 milhões em contratos.
Em seu relatório, o delegado afirma que o modus operandi do grupo de indiciados consistia na realização de pagamentos superfaturados em preço e/ou quantidade, com posterior devolução de parte do valor ao apontado como operador principal da organização criminosa, o empresário e médico Mouhamad Moustafa.
Além de Murad e Lino, foram indiciados os empresários André Becil e Sérgio Bringel, e o advogado Josenir Teixeira. Também foram indiciados Mouhamad, a advogada Priscila Marcolino, e a enfermeira Jennifer Naiyara. Estes três últimos já foram alvos das fases anteriores da investigação, e são apontados como integrantes do núcleo da organização criminosa.
Murad Aziz
Segundo o relatório da PF, existem fortes indícios de que Murad atuava em “parceria oculta” com o empresário Alessandro Pacheco, que tinha empresas contratadas pelo Instituto Novos Caminhos (INC), organização social que prestava serviços em diversas unidades administradas pela Secretaria de Estado de Saúde (Susam).
Desta forma, segundo os investigadores, Murad e Alessandro “compartilhavam os proveitos financeiros dos crimes, aplicando-os ainda em atividades empresariais por meio de parceria oculta”.
O delegado afirma que, em troca dos valores que Alessandro compartilhava, Murad intermediava interesses do empresário nas esferas políticas, dentre eles, fazer com que as empresas de Alessandro fossem “escolhidas” para prestar serviços ao INC.
“MURAD AZIZ também vendia sua influência junto ao Estado do Amazonas a outros fornecedores”, acrescenta o delegado no documento.
A investigação aponta ainda para uma forte relação entre Murad e Mouhamad, que resultava em inúmeros favores financeiros deste último para o primeiro.
“É importante destacar que MURAD AZIZ mantinha uma relação de parceria com MOUHAMAD MOUSTAFA. Essa relação ficou ainda mais evidente e os detalhes mais íntimos foram revelados por meio das conversas travadas via aplicativo de celular e, em especial, pela colaboração de JENNIFER NAYARA, que revelou detalhes que remontam ao ano de 2012, época em que MOUHAMAD começou a estreitar seus laços com a família de OMAR AZIZ e seus irmãos”, escreve Alexandre Teixeira.
A PF conclui que Murad usava da condição de ser irmão do ex-governador e hoje senador Omar Aziz para exercer influência junto ao governo do governador à época, José Melo.
Lino Chíxaro
De acordo com a PF, Lino participava de escritório de advogados que prestava serviço ao INC, no entanto, tinha contribuição muito diferente da simples assessoria. Segundo Alexandre Teixeira, o advogado fazia “interferência política para que os interesses de MOUHAMAD e da ORCRIM fossem realizados, em troca, recebia pagamentos em espécie e também ‘por fora’, através de repasses das empresas controladas pela ORCRIM (SALVARE) para a conta da sociedade de advogados”.
O delegado afirma que Lino atuava como verdadeiro membro da organização criminosa.
“O que avulta a partir dos elementos coletados com as buscas e também a partir de evidências que antecedem à deflagração da operação era de que o senhor LINO JOSÉ DE SOUZA CHÍXARO atuava como verdadeiro membro da organização criminosa, sendo um dos principais responsáveis por atuar politicamente para a permanência do esquema criminoso. A atuação do advogado LINO CHIXARO fugia ao exercício próprio da advocacia”, escreve Alexandre Teixeira no relatório.
André Becil
Segundo o relatório da PF, o empresário participou do desvio de recursos públicos por meio da Amazonas Medical Care e Dani Comércio, das quais é sócio. As empresas mantinham contratos com o INC.
Em um trecho do relatório, o delegado Alexandre Teixeira resume a atuação de André Becil da seguinte forma:
“É o sócio administrador das empresas AMAZONAS MEDICAL CARE e DANI COMERCIO, é responsável pelos desvios causados pela inexecução parcial ou total dos serviços de engenharia médica nas unidades de saúde do INC, assim fazendo com duplo intuito: a) enriquecer-se ilicitamente, b) devolver dinheiro para o médico MOUHAMAD (mentor da ORCRIM)”.
Sérgio Bringel
De acordo com a PF, o empresário é o sócio administrador da BIOPLUS. No período investigado (2014 a 2016), a empresa recebeu mais de R$ 10 milhões de reais para execução de serviços de esterilização de equipamentos médicos. Segundo o delegado, o contrato era “hipersuperfaturado”.
Em um trecho onde resume as acusações contra o empresário, Alexandre Teixeira escreve:
“Entre os fatos que fundamentam seu indiciamento, destaca-se: 1. O grupo BRINGEL, da qual a BIOPLUS faz parte, possui diversos outros contratos com o Estado do Amazonas, cujos indícios apontam para um alcance muito maior das práticas ilícitas por ele comandadas; 2. A fraude era de grande vulto, pois os serviços eram, nas palavras de MOUHAMAD MOUSTAFA, ‘hipersuperfaturados’”.
Josenir Teixeira
A investigação o aponta como contratado para fazer uso de sua expertise em assuntos de terceiro setor junto à organização criminosa. O advogado era, segundo o relatório, remunerado por suas ações intelectuais dentro da organização por meio de pagamentos em espécie e por interposta pessoa, fora do sistema financeiro.
“O investigado também atendia as demandas do mentor da ORCRIM (MOUHAMAD), que controlava todo esquema”, escreve o delegado em outro trecho do relatório, completando:
“Apesar de serem encontradas evidências de que o advogado JOSENIR TEIXEIRA tenha efetivamente prestado assessoria (legal) para os gestores do INC nos aspectos atinentes à organização social e suas peculiaridades (a exemplo de alguns relatórios que ele elaborava após visitas realizadas nas unidades), muito mais evidências, porém, foram encontradas a respeito de sua atuação criminosa para a adequada execução dos desvios (peculatos) perpetrados pela organização criminosa”.
Outros indiciados
No relatório conclusivo complementar, o delegado Alexandre Teixeira indicia mais nove empresários que também participaram do esquema articulado para desviar recursos da saúde pública, são eles: Edson Tadeu Ignácio e Maria do Livramento, respectivamente marido e esposa, proprietários da empresa M L Comercial Alimentos; Marcio Rogério da Silva, administrador da MRS – Segurança Eletrônica; Jonathan Queiroz da Silva da J Queiroz da Silva Ltda.
E ainda: Kelle Regina Viriato Pacheco, sócia responsável da empresa KRV Pacheco, que segundo as investigações, era administrada por seu irmão, Alessandro Viriato Pacheco; Marco Antônio de Jesus Barbosa, da Moema Comunicação; Daniel Roger Goulart Silva da S J Atividade Médica Hospitalar e Jader Helder Pinto, cunhado de Mansur Aziz, irmão de Murad Aziz.
O que disseram os investigados em depoimento:
Com exceção de Jennifer, que assinou acordo de delação premiada, em seus depoimentos, todos os indiciados se declararam inocentes. Alegaram que as contratações de suas empresas ou escritórios foram regulares, que nunca devolveram parte dos recursos recebidos ou que receberam dinheiro ilícito, e que a relação com Mouhamad referente aos contratos sempre foi profissional.
Alguns dos indiciados, como Lino Chíxaro e Murad Aziz, admitiram relação de amizade com Mouhamad, mas que nunca traficaram influência para beneficiar o amigo. Questionados sobre os altos valores que receberam e que tinham origem em empresas do médico, alegaram ser empréstimos, que foram ou estavam sendo pagos.
Murad negou ainda ter relação empresarial com os demais citados na investigação.
Relatório com a Justiça
Alexandre Teixeira informa na conclusão do relatório complementar que ainda não foi concluída a análise dos materiais apreendidos, “em função do grande volume de informação coletada durante o cumprimento das medidas cautelares”.
Os relatórios (final e complementar final) foram concluídos em 29 de janeiro e 13 de fevereiro, e encaminhados para a 4ª Vara da Justiça Federal no Amazonas. Os documentos serão enviados ao MPF, que decidirá se apresenta ou não denúncia contra os investigados com base no conteúdo relatado pelo delegado.