MANAUS – O ex-ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, atribuiu à empresa White Martins e à Secretaria de Estado de Saúde do Amazonas (SES-AM) a responsabilidade pela crise de oxigênio na rede hospitalar do Estado.
Em depoimento nesta quinta-feira, 20, na CPI da Covid, Pazuello disse que a empresa falhou ao não informar de forma clara que já operava além de sua capacidade desde dezembro de 2020.
Enquanto a SES-AM, segundo Pazuello, falhou ao não acompanhar de forma precisa as condições em que a White Martins operava.
O que disse Pazuello:
Fica claro pra mim que a preocupação com o acompanhamento do oxigênio não era um foco da Secretaria de Saúde do Estado do Amazonas, porque não faltou oxigênio e ficou focada em outras coisas, isso lá em dezembro ainda. No próprio plano de contingência apresentado pelo secretaria para nós não apresentava nenhuma medida sobre oxigênio. A empresa White Martins, que é a grande fornecedora, somada à produção da Carbox, que é uma empresa menor, ela já vinha consumindo sua reserva estratégica e não fez essa posição de forma clara. Começa ai a primeira posição de responsabilidade, não tem como isentarmos essa primeira posição. O contraponto disso é o acompanhamento da secretaria de saúde, que não fez. Se a secretaria de saúde tivesse acompanhado, de fato e de perto, a situação da produção e consumo de oxigênio, preocupada com o aumento do oxigênio, a secretaria teria descoberto que estava sendo consumida uma reserva estratégica, e que medidas precisariam ser feitas imediatamente. Vejo ai duas responsabilidades muito claras. Uma: começa na empresa que consome sua reserva estratégica e não se posiciona de uma forma clara. E a outra da secretaria de saúde
Em nota ao ESTADO POLÍTICO, a White Martins rebateu a fala do ex-ministro. De acordo com a fornecedora de oxigênio ao Governo do Amazonas, a SES-AM foi informada em mais de uma ocasião de que o consumo do insumo vinha em uma crescente sem precedentes.
Leia abaixo a nota da White Martins:
Desde o dia 24 de dezembro de 2020, a White Martins vinha sinalizando o aumento do consumo anormal em Manaus (AM) e solicitando informações sobre a previsão de demanda por oxigênio à Secretaria de Saúde do Estado do Amazonas. No início de janeiro, diante do aumento exponencial do consumo de oxigênio na região e da ausência de resposta sobre a previsão de demanda da secretaria de saúde, a empresa formalizou a necessidade de esforços adicionais e a contratação de outros fornecedores para aumentar a disponibilidade de produto dada a demanda descontrolada e acima da capacidade de produção local da empresa. A comunicação foi feita formalmente em carta datada do dia 7 de janeiro enviada por e-mail às 00h03 do dia 08/01 à secretaria de saúde do estado, com a qual a empresa mantém contrato vigente, informando ainda que a companhia vinha fornecendo o produto em quantidades superiores às suas obrigações contratuais. No dia 10/01, o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, convidou os representantes da White Martins, por meio do comitê estadual, para uma reunião em Manaus, na manhã do dia 11/01, para tratar do tema.
Além disso, a White Martins sinalizou formalmente para a Secretaria de Saúde do Estado do Amazonas, em 16 de julho de 2020 e 9 de setembro de 2020, que o consumo de oxigênio fornecido ao Estado já não mais refletia o volume contratado, razão pela qual solicitava providências da Secretaria para que fosse adequado à tal realidade. Em novembro, a SUSAM autorizou, baseado em um estudo feito pela secretaria, um aumento de 21,9% no volume contratado. Este incremento se mostrou muito abaixo do consumo, que estava, em janeiro deste ano, na ordem de 600% acima do volume contratado e 152% acima do consumo registrado pela empresa na última semana de dezembro de 2020.
A previsão de demanda foi informada posteriormente pela Secretaria de Saúde do Estado do Amazonas, em fevereiro de 2021, somente após decisão judicial e recorrentes solicitações da White Martins. A empresa reforça que compete às instituições de saúde informar, formalmente e em tempo hábil, qualquer incremento real ou potencial de volume de gases às empresas fornecedoras. Estas instituições são responsáveis pela gestão da saúde e têm acesso a dados que compõem o panorama epidemiológico da COVID-19, como o índice e a velocidade de contágio da doença, o crescimento da taxa de ocupação de leitos, a quantidade de pacientes atendidos, bem como a classificação dos casos. A White Martins como qualquer fornecedora deste insumo apenas mede o consumo de seus clientes, não tendo condições de fazer qualquer prognóstico acerca da evolução abrupta da demanda.
Em nota à redação, o Governo do Amazonas informou que em nenhum momento antes do dia 13 de janeiro de 2021 a White Martins admitiu não conseguir mais manter o abastecimento de oxigênio.
Segundo o governo, até então, a empresa não havia relatado dificuldades para cumprir com o contratado pelo Estado, mas sim de logística, no dia 7 de janeiro, quanto na ocasião solicitou apoio da SES-AM.
“Nesse mesmo dia, o secretário Marcellus Campêlo, ligou para o ministro Eduardo Pazuello para solicitar apoio logístico para o transporte de oxigênio de Belém para Manaus, atendendo o solicitado pela White Martins”, diz trecho da nota.
“Somente no dia 13 de janeiro, após convocada pelo Comitê de Estadual de Enfrentamento da Covid-19, do Governo do Amazonas, a White Martins admitiu que não teria condições de manter o abastecimento de oxigênio”, completa a nota.
Abaixo, a íntegra da nota da SES-AM:
A Secretaria de Estado de Saúde (SES-AM) informa que, em nenhum momento no mês de dezembro de 2020, a White Martins relatou a impossibilidade de abastecer a rede estadual de saúde com oxigênio medicinal. Até dezembro de 2020, a SES-AM monitorava a demanda por oxigênio conforme relatório apresentado pela White Martins ao final de cada mês e, até então, a empresa não havia relatado dificuldades para cumprir com o contratado pelo Estado.
Somente no dia 7 de janeiro de 2021 foi que a White Martins relatou dificuldades logísticas para suprir a demanda de oxigênio da rede. Nesse mesmo dia, o secretário Marcellus Campêlo, ligou para o ministro Eduardo Pazuello para solicitar apoio logístico para o transporte de oxigênio de Belém para Manaus, atendendo o solicitado pela White Martins.
A empresa também informou à SES-AM, em reunião, que havia feito um planejamento para suprir a demanda da rede pública e privada de Manaus, diante do aumento na demanda pelo insumo, com o transporte de oxigênio de outras unidades da empresa no Brasil, apresentando inclusive um cronograma de chegada de uma balsa de Belém-PA a cada dois dias.
Ao mesmo tempo, a SES-AM iniciou contatos com outros fornecedores locais de oxigênio para garantir reservas para suprir dificuldades enfrentadas pela White Martins. Além disso, a SES-AM manteve tratativas com o Governo Federal para garantir suporte logístico para que o plano elaborado pela White Martins, de trazer oxigênio de outras plantas da empresa para Manaus.
Ainda no dia 30 de dezembro de 2020, a SES-AM encaminhou ofício ao Ministério da Saúde informando sobre as ações de enfrentamento à Covid-19 que vinham sendo adotadas pelo Estado e que, diante do aumento de casos da doença, solicitou a presença da Força Nacional do SUS para ajudar no monitoramento, orientação técnica, bem como operação local de suporte básico e avançado no atendimento à população nas unidades de saúde do Estado.
Somente no dia 13 de janeiro, após convocada pelo Comitê de Estadual de Enfrentamento da Covid-19, do Governo do Amazonas, a White Martins admitiu que não teria condições de manter o abastecimento de oxigênio. De imediato, os Governos do Estado e Federal ampliaram a força-tarefa para normalizar o fornecimento do insumo, esforços que incluíram uma série de medidas, como a ampliação do apoio logístico para transporte de oxigênio de outros estados para Manaus e a transferência de pacientes para atendimento em outras unidades da federação, entre outras medidas.
Ressalta-se que pesquisadores da Fiocruz e da Fundação de Vigilância em Saúde do Amazonas (FVS-AM), em um esforço conjunto de monitoramento genômico, identificaram a prevalência, entre o final de dezembro de 2020 e início de janeiro de 2021, de uma nova variante do novo coronavírus no Amazonas, a P1, muito mais transmissível e letal, responsável pelo aumento exponencial e recorde de internações por Covid-19 no estado.
Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado