MANAUS – Uma paciente puérpera com Covid-19 morreu em Manaus dias após passar por um tratamento com nebulização de hidroxicloroquina. A informação foi divulgada nesta quarta-feira (14) em reportagem da Folha de S. Paulo.
Internada no Instituto da Mulher e Maternidade Dona Lindu (IMDL) desde fevereiro, Jucicleia de Sousa Lira, 33, morreu em 2 de março, 27 dias depois do parto.
A responsável pela nebulização com hidroxicloroquina (medicamento ineficaz contra o novo coronavírus e que pode gerar reações adversas) foi a ginecologista e obstetra paulistana Michelle Chechte, que segundo a Secretaria de Estado da Saúde (SES-AM) atuou por apenas cinco dias em Manaus.
Michelle gravou um vídeo com a paciente, que “viralizou nas redes sociais”, e também fez Jucicleia assinar uma autorização para receber o tratamento experimental.
O viúvo de Jucileia, Cleisson de Oliveira, disse à Folha de S. Paulo que só soube que a esposa havia sido nebulizada com o medicamento depois que familiares dela em Santarém (PA) enviaram o vídeo viral para ele com ela ainda em vida. Da autorização assinada por Jucicleia, Cleisson só soube mais de um mês após a morte dela.
Ela deixou o filho recém-nascido.
Reprodução
A médica Michelle Chechter foi procurada pela Folha, mas preferiu não se manifestar.
Post de Michelle Chechter mostra ela, um outro profissional e o marido da médica, Gustavo Maximiliano Dutra, de avental azul – Reprodução/Instagram
Mesmo após a morte de Jucicleia, o vídeo gravado por Chechter continua circulando até hoje no WhatsApp, nas redes sociais e em publicações de meios de comunicação bolsonaristas.
Até o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Onyx Lorenzoni (DEM) divulgou o vídeo no Twitter (18 dias após a morte), com a legenda: Decisão da médica em conjunto com a paciente. ” de 0 a 10 melhorou 8″.
Outra morte
O jornal relata ainda a morte de Ingrid Chaves, 32. Ela foi internada em 10 de fevereiro e morreu em 26 de fevereiro. O recém nascido morreu em 3 de março.
Ingrid teria sido medicada com hidroxicloroquina, por via oral, logo em 11 de fevereiro e, a partir de então, os familiares receberam o medicamento das mãos de Michelle Chechte para que eles próprios dessem para paciente, sob a alegação de que outros médicos poderiam retirá-la do prontuário.
Para convencer a família do tratamento, Michelle Chechter disse que a hidroxicloroquina tinha o apoio do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e que, por causa disso, sofria oposição política.
O outro lado
Em nota ao ESTADO POLÍTICO, a SES-AM informou que o tratamento aplicado pela médica não faz parte dos protocolos terapêuticos do Instituto da Mulher nem de outra unidade da rede estadual de saúde, “ainda que com o consentimento de pacientes ou de seus familiares”.
A secretaria afirmou que abriu uma sindicância e afastou a profissional tão logo tomou conhecimento do fato. Segundo a SES-AM, Michelle Chechter atuou por apenas cinco dias na unidade. Ela e o marido, também médico, foram integrados na rede no dia 3 de fevereiro, após contratação em regime temporário pela SES-AM junto com outros 2,3 mil profissionais de saúde, via banco de recursos humanos disponibilizados ao Estado pelo Ministério da Saúde, para atuarem durante a pandemia em hospitais da rede estadual.
A pasta informou que duas pacientes, a morreu e outra que teve alta, passaram pela nebulização com hidroxicloroquina, após assinarem um termo de consentimento. Todas as informações sobre o atendimento estariam registradas no prontuário.
Na nota a SES-AM informou que a pasta e o IMDL “não compactuam com a prática de qualquer terapêutica experimental de teor relatado e não reconhecida e entendem que tais práticas não podem ser atribuídas à unidade de saúde, que tem como premissa o cumprimento da lei e dos procedimentos regulares, conforme os órgãos de saúde pública e os conselhos profissionais”.
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