Da Redação |
Em julgamento realizado nesta quinta-feira (10), o ministro André Mendonça, do Supremo Tribunal Federal (STF), pediu vista do processo que pode condenar o deputado federal Silas Câmara (Republicanos) pela prática de “rachadinha”.
Mendonça alegou dúvida sobre a possibilidade do réu ter direito a fazer um acordo com o Ministério Público Federal (MPF).
Com a medida, caso o STF entenda que Silas é culpado, ao final do julgamento, existe grande chance do deputado federal não ser penalizado. Isso porque o caso prescreverá no próximo dia 2 de dezembro.
Os ministros Luis Barroso, que é relator do caso, Alexandre de Moraes, Edson Fachin e a presidente do STF, Rosa Weber, alertaram para as consequências do pedido de vista de Mendonça às vésperas da prescrição.
Moraes ressaltou que, ainda que houvesse a possibilidade de um acordo a essa altura do processo, Silas precisaria confessar que cometeu o crime, o que nunca ocorreu em 12 anos em que o processo tramita, apenas no STF. “Ele sempre disse que é inocente”, afirmou.
Barroso lembrou que o referido acordo precisava ser proposto em algum momento pelo MPF. O que não ocorreu em nenhuma fase do processo e nem agora quando o caso começou a ser julgado no plenário.
Mendonça afirmou ainda que esse seria o primeiro contato dele com o processo. Os colegas o rebateram lembrando que a ação estava no plenário virtual. “Por que não votaram antes, então?”, retrucou o ministro.
Apesar do pedido de vista, a presidente do STF decidiu seguir com o julgamento, uma vez que alguns ministros pediram para adiantar o voto.
Até o momento, 5 ministros votaram pela condenação de Silas: Barroso, Fachin e Moraes, Rosa Weber e Cármen Lúcia.
Já o ministro Kassio Nunes votou pela absolvição do réu. Ele entendeu que não há prova suficiente para condenar Silas.
“No presente caso concreto, os elementos de prova trazidos ao longo da instrução não confirmaram aqueles apresentados na fase inquisitorial revelando-se insuficientes para, acima de qualquer dúvida razoável, confirmar a tese de acusação e fundamentar condenação do réu”.
O relator do caso, Barroso, defendeu no seu voto a pena de 5 anos e 3 meses de prisão, em regime semi-aberto.
Religiosos
Mendonça foi indicado ao STF por Jair Bolsonaro (PL), que é um aliado de Silas.
Evangélido, assim como Silas, o ministro também já participou de agendas religiosas ao lado do deputado federal, entre elas, cultos.
Acusação
Ao pedir a condenação do parlamentar, a vice-procuradora-geral da República, Lindôra Araújo, afirmou que os fatos estão comprovados nos autos, indicando que Silas Câmara implantou uma maneira de agir em seu gabinete, recebendo dinheiro diretamente de secretários parlamentares ou fazendo com que esses pagassem, com seus salários, suas contas pessoais. De acordo com o MPF, a análise dos relatórios da quebra de sigilo bancário de Silas Câmara e 17 assessores no período em questão revela o movimento bancário assim que os secretários parlamentares recebiam salário. Há depósitos na conta corrente do deputado por meio de cheques e transferências eletrônicas e ainda por meio de dinheiro em espécie depositado de forma fracionada em caixas eletrônicos, sem informações dos depositantes, para não levantar suspeitas de órgãos de fiscalização.
Ainda segundo a denúncia, havia um funcionário responsável por recolher os valores, cuja conta bancária registrava movimentação quatro vezes superior a seus rendimentos. Para o Ministério Público, não se sustentam os argumentos da defesa de que os valores recebidos por Silas Câmara seriam quitação de empréstimos ou adiantamentos salariais obtidos pela equipe de servidores, uma vez que não há qualquer comprovação da transferência inicial de recursos aos supostos beneficiários. A tese de que os pagamentos seriam relativos a aluguéis de 64 salas comerciais de propriedade do deputado também foi descartada pelo MPF por não haver contratos de locação que os comprovem.
Defesa
Em sustentação oral, o advogado de Silas Câmara afirmou que foram feitas apenas cinco transferências, em valores modestos, que não chegam a R$ 15 mil, e que seriam quitação de empréstimos pessoais e adiantamentos. Segundo ele, a denúncia foi feita por notórios desafetos políticos, inclusive por pessoa ligada ao primeiro suplente de Silas.
Segundo o advogado, os saques nas contas dos assessores seriam prática comum, para que pagassem suas contas pessoais, numa época em que não havia PIX e nem todos tinham cartão de débito ou crédito, não podendo ser associados a depósitos na conta do deputado. Ele ressaltou que o parlamentar tinha 35 assessores, não sendo crível que somente 17 estivessem sendo obrigados a fazer os repasses. Para a defesa, as provas apresentadas pelo MPF não são seguras e não poderiam ser utilizadas para condenar o acusado por fatos ocorridos há mais de 20 anos.
Relator
Único a se pronunciar até o momento, o relator, ministro Luís Roberto Barroso, votou pela parcial procedência da ação para condenar o parlamentar por peculato a 5 anos e 3 meses de reclusão em regime semiaberto. Para ele, há elementos suficientes para certificar, acima de qualquer dúvida razoável, que o acusado efetivamente se utilizou de seu mandato eletivo para desviar, em proveito próprio, parcela do dinheiro público que deveria ser empregado na remuneração de servidores nomeados em seu gabinete na Câmara dos Deputados. O relator considerou, entretanto, que não há provas suficientes sobre a acusação de que Silas nomeou, como servidores públicos, pessoas que lhe prestavam serviços domésticos de cozinheira e motorista.
Ao analisar a conduta atribuída ao parlamentar, Barroso considerou que não houve subtração de verbas, mas sim o peculato na modalidade desvio, já que os funcionários consentiram em repassar os valores. O ministro afirmou que, infelizmente, a conduta tem sido comum em vários órgãos públicos. Havia assessores nomeados para a Câmara dos Deputados e ao mesmo tempo para a Assembleia Legislativa do Amazonas. “Se a qualidade de funcionário público é inerente ao tipo penal, é evidente que quando cometido por parlamentar federal, em exercício abusivo de suas funções, o delito merece ser apenado mais severamente”, afirmou o relator.
O ministro rejeitou o argumento da defesa de que não se trataria de dinheiro público, mas sim de recursos privados, uma vez que eram depositados legitimamente nas contas bancárias dos secretários parlamentares. “De acordo com o esquema narrado e comprovado, a destinação à conta do réu já era prevista anteriormente. Assim, o trânsito na conta dos assessores era uma mera passagem para o seu destinatário final”, explicou.
Para o relator, os autos revelam um quadro de desvio programado de parcela da remuneração dos secretários parlamentares: os salários eram depositados e, um ou dois dias depois, eram sacados e repassados ou utilizados para pagamentos de despesas pessoais do deputado. Barroso constatou que foi montado um esquema criminoso de desvio de dinheiro público, utilizando-se de pessoas simples, com pouca instrução, que acabavam ficando com quantias irrisórias ao fim de cada mês, ao serem utilizados como “laranjas”.
O julgamento será retomado na próxima quinta-feira (10) com o voto do revisor, ministro Edson Fachin, e dos demais ministros. Silas Câmara foi reeleito deputado federal pelo Amazonas com 125.068 votos. Está em seu sétimo mandato consecutivo.