Por Agência Brasil|
A maioria do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu manter o pagamento de aposentadorias e pensões a ex-governadores ou seus dependentes em ao menos nove estados, por elas terem sido concedidas antes de a prática ser considerada inconstitucional pela Corte.
Prevalece a divergência aberta pelo ministro Gilmar Mendes, para quem, nos casos questionados, há direito adquirido aos vencimentos. Em seu voto, o ministro escreveu que as pensões devem ser mantidas “em virtude da garantia constitucional da segurança jurídica”.
Até o momento, acompanham Mendes os ministros Dias Toffoli, Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin e Nunes Marques, formando a maioria. Cármen Lúcia, relatora, e Luiz Fux foram os únicos que até agora votaram pela suspensão de todos os pagamentos. Restam apenas os votos de Luís Roberto Barroso e André Mendonça.
O assunto é julgado no plenário virtual, em que os ministros têm um período para votar remotamente. A sessão de julgamento está prevista para durar até as 23h59 de 20 de janeiro. Até lá, são possíveis mudanças de posicionamento. A análise pode ser também interrompida por pedido de destaque (remessa ao plenário físico) ou vista (mais tempo de análise).
Em diversos julgamentos ao longo dos últimos anos, o Supremo já derrubou dezenas de leis estaduais e municipais que previam o pagamento de aposentadorias ou pensões vitalícias a ex-governadores ou ex-prefeitos e seus dependentes.
Agora, contudo, a controvérsia diz respeito aos pagamentos que começaram a ser feitos antes da prática ser considerada inconstitucional.
Entenda
O pagamento das pensões antigas foi questionado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) em 2020, por meio de uma arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF). O órgão alegou que a continuidade dessas aposentadorias e pensões viola princípios constitucionais como os de igualdade, impessoalidade e moralidade pública.
A PGR apontou haver notícia sobre o pagamento dessas aposentadorias e pensões em Santa Catarina, no Acre, Rio Grande do Sul, em Minas Gerais, no Amazonas, em Rondônia, na Paraíba, em Sergipe e no Pará.
Isso ocorre porque, em alguns desses estados, como Santa Catarina, o governo decidiu aplicar o chamado efeito ex nunc – ou seja, apenas do julgado para frente – e manter os pagamentos das pensões que já estavam sendo feitos antes de o Supremo condenar a prática.
Em outros casos, como no Acre, o governo estadual informou haver uma batalha na Justiça estadual, com decisões favoráveis à manutenção dos pagamentos. Em estados como Minas Gerais e Pará, os pagamentos chegaram a ser suspensos, mas ainda são alvo de disputa.
Ao Supremo, a PGR pediu que fossem derrubadas todas as leis e normas ainda existentes que possam permitir qualquer pagamento de pensão a ex-governadores ou dependentes, bem como que qualquer pagamento ainda em prática fosse suspenso de imediato.
Votos
Em seu voto, que prevalece até o momento, Gilmar Mendes afirmou serem vigentes e válidos, em virtude da segurança jurídica, todos os atos administrativos que instituíram pensões vitalícias antes de o Supremo considerar a prática inconstitucional.
O entendimento se aplica aos nove estados em que benefícios antigos foram questionados pela PGR. O órgão não apontou a concessão de novas aposentadorias e pensões, além daquelas já concedidas antes de o Supremo declarar a inconstitucionalidade da prática.
Em voto vencido, a relatora, Cármen Lúcia, foi a favor da suspensão imediata de qualquer pagamento. “Aquele que não seja titular de cargo eletivo de Governador do Estado, tendo sido extinto o mandato, não pode receber do povo pagamento por trabalho que já não presta, diferente de qualquer outro agente público que, ressalvada a aposentação nas condições constitucionais e legais estatuídas, não dispõe desse privilégio”, escreveu a ministra.
No Amazonas
De forma unânime, os desembargadores da Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Amazonas (TJ-AM) decidiram em outubro de 2021 extinguir, sem julgamento do mérito, o processo que questionava a aposentadoria especial do ex-governador José Melo.
Ao acatar os argumentos da defesa do ex-governador e o entendimento da relatora, Mirza Telma, o magistrados entenderam que a ação promovida pelo Ministério Público, uma Ação Civil Pública (ACP), foi uma via inadequadamente escolhida para questionar o pagamento da pensão vitalícia de R$ 34 mil mensais.
Em 2017, José Melo teve o mandato cassado pela Justiça Eleitoral, deixou o governo e passou a receber o benefício.
No ano seguinte, o Ministério Público investigou, por meio da promotora Wandete Netto, e, ao apresentar a ACP, afirmou que o pagamento a Melo era “ilegal e ilegítimo” porque foi autorizado pela Secretaria de Estado da Administração (Sead) após a revogação do artigo do artigo da Constituição Estadual que dava direito a ex-governadores receberem benefício – a Emenda Constitucional 75/2011, que revogou o artigo 278 da Constituição do Amazonas, que previa a pensão especial (um subsídio mensal no mesmo valor daqueles recebidos pelos desembargadores estaduais).
A defesa – formada pelos advogados Wilson Peçanha Neto, Jordan de Araújo Farias e Ricardo Hübner – recorreu (apelação cível) e agora obteve decisão favorável. Com isso, se o MP considerar pertinente representar novamente (com outro tipo de ação), o processo voltará à estaca zero.
Outros ex-governadores tiveram suas pensões questionadas, como Amazonino Mendes, que faleceu em 2022, e o senador Eduardo Braga (MDB), que ocupou o cargo de governador entre 2003 e 2010.