MANAUS – O juiz Flávio Henrique Albuquerque de Freitas, do TJ-AM (Tribunal de Justiça do Amazonas), condenou um ex-vereador do município de São Gabriel da Cachoeira a 64 anos e 26 dias de prisão por explorar sexualmente três adolescentes indígenas no município.
Nos autos do processo que condenou, em abril, o ex-vereador, as vítimas afirmaram que os abusos ocorriam sob a promessa de pagamento em dinheiro e oferta de guloseimas. O processo correu em segredo de justiça.
Os crimes do ex-parlamentar foram descobertos durante a operação Cunhatã, da Polícia Federal, no ano de 2013.
De acordo com as investigações da Polícia Federal, um grupo de aliciadoras, empresários e políticos praticava exploração sexual de menores em São Gabriel da Cachoeira. Segundo a PF, meninas indígenas com idade entre 10 e 16 anos eram as mais procuradas pela rede de pedofilia. Aproximadamente 30 índias estão entre as vítimas dos suspeitos no município, que fica localizado na faixa de fronteira entre o Brasil e a Colômbia. A população é de maioria indígena, composta por 23 etnias.
Ainda de acordo com a PF, os valores pagos aos aliciadores variavam conforme a idade da vítima e com o fato de serem virgens ou não. A investigação ouviu 16 adolescentes e pré-adolescentes. Destas, 13 confirmaram que sofreram abuso. A maioria das vítimas era da etnia Baré. Há relatos de que algumas das meninas tenham engravidado.
Após o cumprimento de mandados de prisão, a PF disse que as meninas eram agenciadas por duas aliciadoras que cobravam valores entre R$ 50 e R$ 400. Elas recebiam presentes ou dinheiro. A PF afirmou ainda que, na maioria dos casos, as famílias das meninas sabiam da prática do crime.
O caso
A condenação resultou de uma ação penal movida pelo Ministério Público Federal, com base em Inquérito Policial que denunciou a existência de uma rede de exploração sexual de menores indígenas no município de São Gabriel da Cachoeira, sendo investigada pelo procedimento administrativo que se denominou “Operação Cunhantã”.
Nos depoimentos, em Juízo, as vítimas afirmaram que os abusos ocorreram na residência do acusado, onde este, sob a promessa de pagamento em dinheiro e oferta de guloseimas, as abusava.
Em um dos casos, uma das meninas indígenas registrava 11 anos de idade e, em depoimento, relatou que nunca tinha mantido relação sexual e que, ao entrar no quarto do acusado, este a despiu à força, a agrediu com socos na nuca e consumou o ato carnal.
Em outro caso, uma outra vítima – uma adolescente indígena de 12 anos à época – , também teve sua primeira relação sexual com o acusado que, em duas ocasiões em que consumou o ato sexual, lhe ofereceu valores que variaram entre 20 e 30 reais em dinheiro, além de balas que este guardava em sua geladeira.
Uma das testemunhas de acusação, mencionou ainda, nos autos, que após denúncias que circularam na imprensa, algumas meninas – supostas vítimas, além de pessoas que tinham conhecimento dos fatos – alegaram perseguição e ameaça por parte do acusado e de pessoas de seu círculo pessoal.
Culpabilidade extremada
O juiz Flávio Henrique Albuquerque de Freitas, na sentença, afirmou que “o réu agiu com culpabilidade extremada à espécie, visto que (…) este submeteu suas vítimas à conduta punida pelo ordenamento por quantias aviltantes, situação que somente foi passível de ocorrer em razão de as vítimas, então, possuírem reduzidíssimo grau de percepção da realidade, bem como extremada necessidade material”, apontou.
O magistrado também mencionou a condição social do acusado – à época, vereador – o que, torna seu comportamento ainda mais reprovável. “Há elementos nos autos que deponha contra o comportamento do réu em seu meio social, qual seja, o exercício da prestigiosa atividade laboral de vereador, o que incute maior reprovabilidade de seu comportamento, dado que o representante do povo no Município deveria portar escorreita e invejável conduta”, citou o juiz.
Ao condenar o acusado a 64 anos e 26 dias de reclusão, em regime inicialmente fechado, pelos crimes tipificados nos art. 213, §1º; 217 e 218-B §2º do Código Penal Brasileiro, o juiz Flávio Henrique Albuquerque de Freitas apontou que o réu, segundo consta na reconstituição fático-probatória “buscava construir uma rede de prostituição de menores em seu benefício, por meio da qual uma criança/adolescente abusada passava a capturar novas potenciais vítimas”, citou.
Para o magistrado, as consequências dos crimes praticados são danosas “não somente às vítimas, que carregarão para sempre os traumas irreparáveis da ação do réu, como também à comunidade, por ter colaborado efetivamente para desestruturação social de São Gabriel da Cachoeira”, concluiu o juiz Flávio Henrique Albuquerque de Freitas.