MANAUS – O Batman, super-herói fictício das histórias de quadrinho e lembrado não somente pela sua capa preta, mas pelo ímpeto em promover “justiça” na famosa Gotham City, foi a personagem usada pelo professor doutor Mário João Ferreira Monte, docente da Universidade do Minho (Portugal), para chamar atenção ao risco que o “justiçamento” oferece às sociedades democráticas.
A fala se deu durante a sua palestra “Justiça penal sem Direitos Humanos não é Justiça”, no segundo dia do Seminário Internacional de Direito Militar e Direitos Humanos, em Manaus.
Para o jurista português, em ambientes que concentram narrativas como as de “Gotham City”, marcadas pela criminalidade e pelo comando de famílias mafiosas, mas também com instituições constituídas, na esfera judicial, policial e prisional, “Batman é o remédio para o fracasso desse sistema”. O professor doutor da Universidade do Minho advertiu ainda: “Não há justiça penal fora da lei”.
Mário Monte lembrou que apesar da ascensão de “partidos políticos e até de governo, cuja base tem propostas altamente securitárias, repressoras e punitivas”, como na Europa nos últimos anos e que estão na ordem do dia, não há no mundo lugar para heróis que agem ao arrepio da lei, razão pela qual é preciso atenção diante de protagonismos excessivos.
“Por muito que se explique sobre o sistema penal e que ele deve assentar-se em princípios humanistas, há quem se proponha protagonizar medidas e estratégias de combate ao crime, dando prevalência à eficácia e à eficiência em detrimento das garantias”, disse.
“E há lugar para homens-morcego, com poderes extraordinários?”, questionou o jurista português. Para ele, quem age à margem da lei, como Batman, é um anti-herói. “Os nossos heróis existem, mas ao contrário dos das histórias em quadrinho, são heróis anônimos, policiais que todos os dias correm risco no exercício da função, promotores, procuradores e juízes, que discretamente arriscam suas vidas ao cumprir seu dever”, entre tantos.
Esse heroísmo não tem sentido algum se for desprovido de uma ética que não leve em consideração a técnica e a práxis, elementos fundamentais na atividade judicante, de acordo com o desembargador Luiz Sérgio Fernandes de Souza, magistrado do Tribunal de Justiça de São Paulo e facilitador do tema “Reflexões sobre a Ética no campo da atividade jurisdicional”, no Seminário Internacional de Direito Militar e Direitos Humanos.
Luiz Sérgio iniciou sua fala com um texto de Santiago Dantas, jornalista e advogado brasileiro, como fio condutor de sua análise, diante de problemas que a política não estava preparada para resolver, numa conjuntura tão intensa e polarizada como a atual. O desembargador fez questão de deixar claro que “o judiciário não é um salvador da Pátria”, mas reconhece que a “judicialização da política trouxe como corolário a politização do judiciário”.
O magistrado lançou para o centro do debate a preocupação com práticas de operações bastante exploradas pela mídia e com grande repercussão na sociedade, como a Lava Jato. “São práticas que devem nos fazer, pelo menos, refletir. No lugar de nós desenvolvermos um processo dialógico em que todos os atores têm voz em um ambiente público, buscou-se a construção de uma verdade processual em um ambiente privado. Por quê?”, questiona.
Na opinião do desembargador, o processo judicial tem que ser o mais dialógico possível. “É preciso resgatar uma ética em que a práxis posta, não só a técnica, se coloque numa discussão feita no espaço público”, pois o Judiciário deve sim, na avaliação dele, satisfação à sociedade.
Dimensão Moral do Direito
Depois de tratar sobre ética, a terceira e última palestra da mesa “Jurisdição e Direitos Humanos”, nesta quinta (10/10), teve como tema “Dimensão Moral do Direito: existem Direitos desumanos?”, assunto abordado pelo professor Dr. Rodrigo Reis Ribeiro Bastos, docente da Faculdade Santa Tereza e da Escola da Magistratura do Amazonas (ESMAM). Para ele, uma sociedade melhor perpassa pela mudança de conduta de cada cidadão.
Seminário
O Seminário Internacional de Direito Militar e Direitos Humanos foi dividido em três etapas – Brasília (realizada no dia 7), Manaus (9, 10 e 11) e Boa Vista (12), e é uma iniciativa do Superior Tribunal Militar (STM), Escola Superior da Magistratura do Amazonas (Esmam), Centro de Ensino Unificado de Brasília (Uniceub) e Comando Militar da Amazônia (CMA), com apoio de vários órgãos: Governo do Amazonas, Prefeitura de Manaus, Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM) e Associação dos Magistrados da Justiça Militar da União (Amajum).
O patrocínio é do Banco Safra, Associação dos Notários e Registradores do Amazonas (Anoreg-AM), 1.º Ofício de Imóveis e Protesto de Letras Manaus, 4.º Ofício de Registro de Imóveis e Protesto de Títulos, Associação de Poupança e Empréstimo (Poupex) e Fundação Habitacional do Exército (FHE).