Por Lúcio Pinheiro |
O juiz titular da 2ª Vara do Tribunal de Júri, em Manaus, diz que é vítima de perseguição e que o motivo, “talvez”, seja porque suas decisões enquanto atuava no município de Coari não tinham a simpatia da opinião pública.
No último dia 15, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) decidiu abrir um Processo Administrativo Disciplinar (PAD) contra o juiz e afastá-lo cautelarmente das funções.
No entendimento do CNJ, em 2016, Alfaia teria tomado, “deliberadamente”, uma decisão em um processo para beneficiar Adail Filho, então prefeito de Coari. O juiz afirma que sua decisão foi técnica e obediente à legislação.
“Considero que estou apenas recebendo uma perseguição pela controvérsia que cerca o nome do grupo que comanda administrativamente, politicamente, o município de Coari. Talvez, se eu tivesse julgado conforme o sentimento social, eu não estivesse passando pelos problemas que estou passando. Mas, o magistrado, a nossa independência, que nos é garantida pela Constituição, ela é justamente colocada para prevenir que o magistrado julgue conforme o sentimento social. Magistrados não julgam conforme o sentimento social. Magistrado deve obediência à Constituição e às leis brasileiras. Não me cabe decidir conforme a população ou certa opinião pública acha que eu devo decidir. Devo simplesmente decidir conforme a lei, de forma técnica”, disse o juiz, em entrevista à jornalista Rosiene Carvalho, da rádio Bandnews Difusora, exibida nesta terça-feira (21).
Na entrevista, o magistrado afirma que o relator do caso no CNJ, Luís Felipe Salomão, está equivocado ao afirmar que ele atuou em um processo quando não tinha mais competência.
“Uma mera apreciação da tramitação dos processos, e uma mera leitura das minhas decisões, das minhas sentenças, [serviria] para verificar que você pode não concordar com elas, mas não pode falar que elas não estejam seguindo os parâmetros estabelecidos pela legislação e pela constituição”, declarou Alfaia.
O juiz afirmou que todas as investigações feitas contra ele até aqui foram arquivadas, por isso confia que a iniciada no CNJ terá o mesmo desfecho.
“Todas elas foram arquivadas, exaustivamente instruídas e investigadas, e foram arquivadas, inclusive com a anuência do próprio Ministério Público […]. Então, fico muito tranqüilo para falar sobre esses fatos, porque na verdade foram todos arquivados. O que ocorre aqui é aquela clássica situação de que uma mentira contada várias vezes ela se torna verdade”, disse Alfaia.
Julgamento
Para o relator do processo no CNJ, Luís Felipe Salomão, Alfaia tomou a decisão que beneficiou o político ciente de que não tinha mais competência para atuar no caso.
No seu voto, o conselheiro ainda listou outros casos que, para ele, colocam sob suspeita a atuação do juiz durante sua titularidade na comarca de Coari.
“É visível que, deliberadamente, o magistrado, mesmo sabendo da mudança de competência, prolata sua decisão, declarando a nulidade do procedimento investigatório criminal dois dias após a diplomação do prefeito. Então, não me parece possível alegar aqui que o magistrado não sabia o que estava fazendo”, disse o relator no julgamento.
Votaram favoravelmente ao afastamento de Alfaia os seguintes conselheiros: Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, Salise Monteiro Sanchonete, Jane Granzoto Torres da Silva, Márcio Luiz Coelho de Freitas, Sidney Madruga, João Paulo Santos Schoucair, Marcello Terto e Silva e Luís Felipe Salomão.
Durante o julgamento, o advogado do magistrado defendeu que não era necessário o afastamento de Alfaia, uma vez que ele não atua mais em Coari.
“Esta defesa entende desnecessária, sobretudo porque o magistrado não exerce mais jurisdição na comarca de Coari. Está completamente afastado dos fatos. Hoje, o magistrado aqui requerido exerce suas atribuições como titular da 2ª Vara do Tribunal de Júri da comarca de Manaus. Então, completamente desnecessário e desarrazoado o seu afastamento”, defendeu Maurício.
https://www.cnj.jus.br/cnj-afasta-juiz-e-vai-investigar-suposta-participacao-em-organizacao-criminosa-no-am/: Juiz diz que, ‘talvez’, seja perseguido por julgar em desacordo com o ‘sentimento social’O caso
Adail Filho respondia um processo criminal por pressionar testemunhas em uma investigação contra o pai dele, Adail Pinheiro.
Em 2016, Adail Filho foi eleito prefeito, o que lhe garantiu direito de ser julgado apenas pelo Tribunal de Justiça (TJ-AM). No entanto, Afaia, que era juíz eleitoral, após diplomar o político prefeito, tomou a decisão de anular a investigação.
O entendimento do CNJ e do Ministério Público (MP) é que, à partir da diplomação de Adail, o caso só poderia ser objeto de análise do TJ-AM. E que, na condição de juiz eleitoral, Alfaia sabia disso.