MANAUS – A Justiça Federal absolveu, nesta terça-feira (2), o ex-secretário de Saúde (Susam), Wilson Alecrim, o ex-presidente do Sindicato dos Estabelecimentos de Serviços de Saúde do Estado do Amazonas (Sinessam), Mariano Brasil Terrazas e outros cinco réus acusados pelo Ministério Público Federal (MPF) de dispensa ilegal de licitação na contratação do Hospital Santa Júlia, pelo governo do estado, para realização de cirurgias cardíacas infantis, em Manaus.
Na decisão, o juiz federal substituto Luís Felipe Pimental da Costa, julgou improcedente a ação penal formulada pelo Ministério Público Federal que pedia o ressarcimento integral do dano, segundo o órgão, causado ao patrimônio público, no valor de R$ 11,9 milhões.
“Vem sendo interpretado de modo muito restritivo pelo STF e especialmente pelo STJ e pelo TRF1, exigindo-se prova clara da prática do crime, para que se permita a condenação de quem incorra no tipo. Não é o que se verifica na espécie”, diz o juiz em trecho da decisão.
Na denúncia, o MPF apontou falhas na elaboração dos projetos básicos em que se baseiam os contratos e na checagem dos documentos analisados pelos agentes públicos da Secretaria de Estado de Saúde (Susam), como a declaração de que o Hospital Santa Júlia seria o único capaz de realizar cirurgias cardíacas em crianças no Amazonas.
A declaração foi assinada pelo ex-presidente do Sindicato dos Estabelecimentos de Serviços de Saúde do Estado do Amazonas (Sinessam), Mariano Brasil Terrazas, e pelo atual presidente do sindicato, Adriano da Silva Terrazas, réus no processo. Mariano Terrazas, que antecedeu o atual presidente à frente do sindicato, também era integrante do corpo de trabalho do hospital beneficiado. O documento foi utilizado pela Susam para justificar a não realização de licitação para contratar serviços médicos especializados de alta complexidade na área de cirurgia cardíaca infantil.
Na análise da ação, o juiz federal concluiu que é incontestável que o serviço foi efetivamente prestado pelo Santa Júlia.
“Firmada tal premissa, ainda que se considere comprovadas a possibilidade de licitação e a existência de dolo específico, não há como se chegar à mesma conclusão quanto ao prejuízo.
Por um lado, a testemunha Wagner afirma que não houve dano ao erário com a contratação do Santa Júlia. Por outro, todas as testemunhas foram claras ao reconhecer a capacidade do Santa Júlia e a necessidade de que o hospital prestasse o serviço, ainda que o Adventista fosse também contratado para fazê-lo concomitantemente. Isso porque o Adventista não teria condições de atender a toda demanda do Estado do Amazonas sozinho. Nesse cenário, sendo o preço da prestação do serviço pelo Santa Júlia aquele efetivamente pelo qual foi contratado, não há como se vislumbrar do modo claro o prejuízo, a não ser pela diferença entre as cotações, o que não perfaz todo o contrato”, conclui o magistrado em outro trecho.
Outro lado
Para o MPF, a Susam deveria ter checado a veracidade da declaração com outras entidades da classe médica, como o Conselho Regional de Medicina (CRM) ou o Cadastro Nacional dos Estabelecimentos de Saúde (CNES). A dispensa de licitação foi, segundo o MPF, indevida, pois havia a possibilidade de ampla concorrência, já que o Hospital Adventista de Manaus também possuía capacidade técnica para prestar os serviços.
Denúncia partiu do Iaci
A denúncia partiu de representação da ONG Instituto Amazônico de Cidadania (Iaci) e mostrou que a contratação do Hospital Santa Júlia, iniciada em 2011, ocorreu por inexigibilidade de licitação, sob a justificativa de ser o único estabelecimento de saúde do estado capaz de realizar cirurgias cardíacas em crianças. A prestação do serviço se estendeu, por meio de aditivos e novas contratações por inexigibilidade, até 2013. Os recursos destinados à contratação desse serviço foram repassados à Susam pelo governo federal.
Em 2016, o MPF denunciou à Justiça o ex-secretário de Saúde do Amazonas, Wilson Duarte Alecrim, o ex-sócio-gerente do Hospital Santa Júlia, Edson Sarkis Gonçalves, e ex-dirigentes sindicais de estabelecimentos de saúde no Estado, pela dispensa ilegal de licitação. No mesmo ano, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) indeferiu pedido liminar no recurso apresentado pelos sócios do Hospital Santa Júlia e manteve a decisão judicial que bloqueou os bens deles, no valor que totalizava R$ 12 milhões.