Por Agência Senado|
O deputado Alexandre Frota (PSDB-SP) disse nesta quarta-feira (30) que o Palácio do Planalto emprega três assessores responsáveis por uma “milícia virtual” que opera campanhas de ataques nas redes sociais contra adversários e dissidentes do governo. O coordenador das atividades seria Carlos Bolsonaro, filho do presidente da República, Jair Bolsonaro.
O depoimento de Frota foi dado à comissão parlamentar mista de inquérito que investiga notícias falsas nas redes sociais e assédio virtual, a CPI Mista das Fake news. O deputado citou como membros do grupo os servidores Tercio Arnaud Tomaz, José Matheus Salles Gomes e Mateus Matos Diniz. Os três estão lotados na Presidência da República, em cargos comissionados, desde janeiro. Eles já foram convocados para prestarem depoimento à CPI.
” Eu sei tudo o que eu vi, vivi e ouvi. A rede de intrigas de Bolsonaro produz material em escala atacando quem estiver na frente ou venha a discordar. Ficou claro que o Palácio do Planalto virou um porto seguro de terroristas digitais. Fui o primeiro a denunciar, e por isso fui expulso do PSL ” – disse o deputado.
Frota relatou que os três servidores trabalharam na campanha presidencial de Bolsonaro operando “redes de ataques” e agora tiveram a tarefa “oficializada” com dinheiro público, dando continuidade a ela dentro do governo. O deputado afirmou que já presenciou o grupo reunido com Carlos Bolsonaro e o presidente Jair Bolsonaro no Planalto.
O modus operandi dessas “milícias”, segundo explicou Frota, usa contas falsas em redes sociais, disparos automatizados e ataques combinados. Os participantes da rede se reúnem em fóruns ou aplicativos de mensagens, escolhem alvos e elaboram conteúdos específicos, que podem ser imagens, vídeos, notícias falsas ou hashtags. O material chega às redes de forma sincronizada e é amplificado por usuários reais e perfis mecanizados. Empresas de marketing digital também atuariam tanto na produção quanto na divulgação.
Núcleos
Além do grupo do Planalto, Frota apontou outros dois núcleos que atuariam com o mesmo método e com os mesmos objetivos: um deles coordenado pelo blogueiro Allan dos Santos, responsável pelo portal Terça Livre, a partir de uma residência em Brasília (DF); e outro lotado em um gabinete parlamentar da Câmara dos Deputados.
Apesar de usar o termo “milícias” para se referir aos grupos, Frota destacou que não pode fazer nenhuma conexão dessas atividades com as organizações paramilitares que atuam em centros urbanos. Perguntado sobre a compra de disparos em massa de mensagens, ele também disse não conhecer detalhes sobre o financiamento desses serviços.
O deputado entregou à CPI uma coletânea de ataques de perfis apoiadores de Bolsonaro a membros do governo, como o vice-presidente Hamilton Mourão e o ex-ministro da Secretaria-Geral da Presidência Carlos Alberto dos Santos Cruz. Segundo ele, os exemplos ilustram a orquestração de “linchamentos” virtuais e mostram a conivência do presidente com as atividades.
Durante a audiência, Frota teve um embate com o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-RJ), líder do PSL e também filho de Jair Bolsonaro. Eduardo disse que Frota só apresentou “baboseiras e ilações” à CPI. Também afirmou que, durante a campanha eleitoral, Frota “mendigava” a companhia do pai e se mostrou mais “promíscuo” ao mudar de atitude do que quando atuava em filmes pornográficos. Em resposta, Frota chamou Eduardo de “mimado”, “nenenzinho” e “frouxo”, e disse que o filho de Bolsonaro assistia e gostava de seus filmes.
Queiroz
Alexandre Frota também relatou que, em fevereiro, recebeu uma ligação de Bolsonaro após um pronunciamento no Plenário da Câmara dos Deputados no qual defendeu a prisão de Fabrício Queiroz, ex-assessor da família Bolsonaro flagrado com movimentações financeiras milionárias pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) e acusado de operar um esquema de laranjas num possível esquema de “rachadinha” (devolução de parte do salário de funcionários ao parlamentar que os contratou).
Na ocasião, Frota ainda era membro da bancada do PSL. Segundo disse, depois de encerrar o pronunciamento ele ouviu do presidente por telefone que deveria “calar a matraca”. Frota se dispôs a ceder o seu sigilo telefônico à CPI para comprovar a conversa. O senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), filho do presidente, também teria reclamado das declarações. Queiroz trabalhou no gabinete de Flávio quando este era deputado estadual.
Frota foi indagado se o dinheiro proveniente de “rachadinhas” poderia ter abastecido as operações de ataques virtuais durante a campanha eleitoral, e respondeu não saber se era o caso.
O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) afirmou que essa revelação foi a mais grave de toda a oitiva, pois evidenciaria obstrução da justiça por parte de Bolsonaro.
” Pela primeira vez existe um depoimento que dá conta de que o presidente da República entrou em contato com um membro do Congresso para que ele não se manifestasse em relação a alguém que está sendo investigado pelo Ministério Público, que várias vezes tem sido chamado a depor e não tem ido ” – afirmou RAndolfe.
Críticas
O depoimento de Alexandre Frota foi contestado por parlamentares da base do governo, que usaram a mudança de partido do deputado para acusá-lo de “ressentimento”. A deputada Caroline De Toni (PSL-SC) disse que se as acusações de Frota forem verdadeiras, ele teria sido conivente com o que testemunhou antes de trocar o PSL pelo PSDB. Para ela, no entanto, as declarações do colega não trazem provas concretas.
O deputado Filipe Barros (PSL-RJ) também classificou o depoimento como um “discurso político”, e que Frota abandonou o governo porque não teria conseguido emplacar indicações nas áreas da cultura e do turismo. Já a deputada Bia Kicis (PSL-DF) disse que o objetivo das investigações da CPI é promover um “terceiro turno” das eleições de 2018 e promover a censura nas redes sociais.