RIO DE JANEIRO (Reuters) – Meggy Fernandes votou em Jair Bolsonaro nas eleições presidenciais de 2018 no Brasil, atraída pela promessa do ex-capitão do Exército de extrema direita de sacudir uma estrutura política atolada em infindáveis escândalos de corrupção.
Mas depois de vê-lo abandonar suas promessas anticorrupção, fazer pactos com os políticos que ele prometeu evitar e, o mais importante, estragar a resposta do Brasil ao coronavírus, Fernandes, 66, agora diz que errou ao confiar no Bolsonaro.
“Estou revoltadíssima com o meu voto”, disse ela em um estacionamento de supermercado no Rio de Janeiro, em uma manifestação pró-impeachment incomum convocada por grupos de direita, realizada neste domingo, 24. “Bolsonaro está fazendo um péssimo governo. Ele está fazendo um desserviço à nação. Ele está fazendo uma orientação totalmente errada quanto à pandemia.”
Apesar de negar repetidamente a gravidade da pandemia e comandar uma resposta que deixou o Brasil com o segundo maior número mundial de mortes por Covid-19 depois dos Estados Unidos, Bolsonaro encerrou 2020 em alta nas pesquisas, impulsionado por um generoso pacote de apoio ao coronavírus.
2021, porém, começou menos amistoso. O programa de auxílio emergencial agora acabou, enquanto uma segunda onda da doença ganha força. Outros ficaram irritados com o atraso e lentidão da campanha de vacinação contra o coronavírus pelo governo federal e com a promessa pessoal de Bolsonaro de não tomar nenhuma nenhum imunizante contra o vírus.
Um aumento recente de casos na cidade de Manaus (AM), que foi um dos primeiros locais gravemente atingidos pelo vírus durante a primeira onda, provou ser outra mancha na resposta do presidente ao coronavírus. A cidade ficou sem oxigênio na semana passada, deixando hospitais dependendentes de cilindros do mercado negro, ou tanques importados da Venezuela.
O apoio a Bolsonaro teve a maior queda desde o início de seu governo em 2019, segundo pesquisa Datafolha na sexta-feira. Sua administração foi classificada como ruim ou péssima por 40% dos entrevistados, em comparação com 32% no início de dezembro. Pouco menos de um terço dos entrevistados classificou o governo de Bolsonaro como bom ou excelente, contra 37% antes.
Em Brasília, porém, Bolsonaro parece estar em terreno mais estável. A maioria dos brasileiros rejeita seu impeachment, revelou uma segunda pesquisa do Datafolha na sexta-feira. O levantamento mostrou que 53% dos entrevistados eram contra a abertura de processos de impeachment pelo Congresso, contra 50% em pesquisa anterior. O percentual a favor caiu de 46% para 43%.
Os candidatos apoiados por Bolsonaro também devem ganhar o controle do Congresso no mês que vem. Sua crescente disposição para discutir negociações políticas o ajudou a garantir uma base de parlamentares de centro-direita que poderiam eliminar qualquer chance de impeachment.
Mas foram exatamente essas parcerias que trouxeram um punhado de manifestantes a um estacionamento na Barra da Tijuca, no Rio, neste domingo.
Convocados pelo Vem Pra Rua e Movimento Brasil Livre, dois grupos de direita cujos protestos em todo o país em 2016 ajudaram a precipitar o impeachment e posterior destituição da ex-presidente Dilma Rousseff, os protestos deste domingo foram repletos de ex-apoiadores do Bolsonaro revoltados. Eventos semelhantes aconteceram em São Paulo e Brasília, com protestos de esquerda pró-impeachment em todo o Brasil no sábado.
Ainda que de posições antagônicas no espectro ideológico, as organizações envolvidas nos protestos do fim de semana têm em comum os argumentos utilizados para criticar o governo e o presidente.
Temas como a corrupção, as trocas de cargos e emendas por apoio político, a necessidade do retorno do auxílio emergencial e os problemas relacionados à gestão da pandemia, além dos problemas em torno da vacina e do próprio impeachment, foram levantados como motivos para as manifestações deste fim de semana por ambos os lados
Embora a participação no Rio tenha sido pequena, se os números aumentarem nos próximos meses, isso pode representar um problema para o presidente antes de 2022, quando ele certamente buscará a reeleição.
Até dezembro do ano passado, quando o Congresso encerrou seus trabalhos, Bolsonaro já era alvo de cinco pedidos de abertura de processo de impeachment, segundo a Agência Câmara, um deles já arquivado.
Partidos da oposição — PT, PSB, PDT, PSOL, PCdoB, e Rede — preparam um novo pedido a ser apresentado à Câmara, motivado pela questão sanitária. Eles apontam a omissão do governo.
Como outras pessoas no protesto, Patricia Resende, uma funcionária pública de 57 anos, disse que Bolsonaro dificilmente sofrerá impeachment.
Ela disse que muitos de seus amigos que votaram em Bolsonaro ainda gostavam dele. Mas Resende disse que ela veio para “tomar uma posição” contra o que ela descreveu como sua “fraude eleitoral”. “Ele nega o coronavírus”, disse ela. “Ele não tentou comprar vacinas suficientes para uma população de mais de 200 milhões de pessoas.”
Enquanto a multidão se reunia, Fernandes pegou o microfone e fez um discurso emocionado sobre como Bolsonaro lidou com a pandemia e sua decepção com sua presidência. “‘Viva o Bolsonaro’”, ela exclamou ao terminar, antes de perceber seu erro, corando e se corrigindo rapidamente. “Desculpe, eu quis dizer ‘Fora, Bolsonaro’”.