MANAUS – A juíza federal Jaiza Fraxe aceitou a denúncia do Ministério Público Federal (MPF) e Ministério Público Estadual (MP-AM apresentada contra os ex-secretários estaduais de Saúde José Duarte dos Santos Filho, Pedro Elias de Souza e Wilson Alecrim, na investigação em que se descobriu que o Governo do Amazonas bancou o tratamento de membros do Judiciário, políticos, parentes e amigos de pessoas ligadas a agentes públicos no hospital Sírio Libanês, em São Paulo.
A ação foi proposta pelo MPF e MP-AM em abril de 2018. A denúncia foi aceita no dia 27 de junho deste ano. Com a medida, os três passam para a condição de réus, podendo então apresentarem defesa.
O MPF questiona a legalidade dos gastos com o tratamento, que chegaram a R$ 4,4 milhões, no período de 2012 a 2016. Nesses cinco anos, o governadores eram Omar Aziz (PSD) e José Melo.
Para o MPF, os tratamentos foram realizados mediante autorização pessoal dos réus, na condição de Secretário Estadual de Saúde, cada um a seu tempo, e ocorreram junto ao hospital particular de alto padrão, em São Paulo, e que os pacientes eram escolhidos de maneira subjetiva.
Veja a lista dos pacientes que tiveram tratamentos pagos pelo Estado clicando aqui.
O MPF sustenta na ação que não questiona a necessidade ou não dos tratamentos médicos realizados, mas sim o modo pelo qual esses tratamentos foram custeados, tendo havido a utilização do patrimônio público, de forma irregular e sem transparência, para pagamento de despesas privadas de pessoas que detinham ou detém vínculos pessoais com altas autoridades do Estado.
Pedidos do MPF e MP-AM
A ação pede a condenação dos réus pela prática de atos de improbidade administrativa e a decretação de indisponibilidade de bens necessários à reparação integral dos prejuízos por eles causados. Pede ainda a suspensão dos direitos políticos pelo prazo de cinco anos, o pagamento de multa civil no valor de 20 vezes a última remuneração por eles recebida, no exercício das funções públicas, e a proibição de contratarem com os poderes públicos ou de receberem, direta ou indiretamente, benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual sejam sócios majoritários, pelo prazo de três anos.
Abaixo, a íntegra da decisão:
PROCESSO: 1001115-47.2018.4.01.3200
CLASSE: AÇÃO CIVIL PÚBLICA CÍVEL (65)
AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (PROCURADORIA)
RÉU: JOSE DUARTE DOS SANTOS FILHO, PEDRO ELIAS DE SOUZA, WILSON DUARTE ALECRIM
Advogados do(a) RÉU: YURI DANTAS BARROSO – AM4237, CLOTILDE MIRANDA MONTEIRO DE CASTRO – AM8888, CARLOS EDGAR TAVARES DE OLIVEIRA – AM5910
Advogados do(a) RÉU: LUCIVALDO BREVES DA SILVA – AM10226, ISAAC LUIZ MIRANDA ALMAS – AM12199
Advogados do(a) RÉU: CLOTILDE MIRANDA MONTEIRO DE CASTRO – AM8888, CARLOS EDGAR TAVARES DE OLIVEIRA – AM5910, YURI DANTAS BARROSO – AM4237
DECISÃO
Trata-se de Ação de Improbidade Administrativa ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL contra JOSÉ DUARTE DOS SANTOS FILHO, PEDRO ELIAS DE SOUZA e WILSON DUARTE ALECRIM, objetivando a sua condenação às sanções previstas no art. 12, I, II e III, da Lei nº 8.429/92.
Narra o MPF que entre 2012 e 2016, o Estado do Amazonas pagou, utilizando-se de verbas federais e estaduais, tratamentos de saúde particulares em benefício de agentes privados.
Aduz que os tratamentos foram realizados mediante autorização pessoal dos réus, na condição de Secretário Estadual de Saúde, cada um a seu tempo, e ocorreram junto ao HOSPITAL SÍRIO LIBANÊS em São Paulo e que os pacientes eram escolhidos de maneira subjetiva.
Alega que o total dos gastos alcançou o valor de R$ 4.451.325,95 (quatro milhões, quatrocentos e cinquenta e um mil e trezentos e vinte e cinco reais e noventa e cinco centavos).
Sustenta que, na ação, não se está questionando a necessidade ou não dos tratamentos médicos realizados, mas sim o modo pelo qual esses tratamentos foram custeados, tendo havido a utilização do patrimônio público, de forma irregular e sem transparência, para pagamento de despesas privadas de pessoas que detinham ou detém vínculos pessoais com altas autoridades do Estado.
Com a inicial, vieram os documentos de ID 5110489 e seguintes.
Decisão, no ID 5144074, deferindo a indisponibilidade de bens.
Defesa prévia de José Duarte dos Santos Filho no ID 5623997.
Defesa Prévia de Wilson Alecrim no ID 5625787.
Defesa Prévia de Pedro Elias no ID 5912308.
Parecer ministerial, no ID 5900548.
Na decisão de ID 74882063, foi homologado o Termo de Ajustamento de Conduta de ID 173782347, celebrado entre o MPF, MPE e por Domingos Jorge Chalub Pereira.
É o relatório. DECIDO.
Como é cediço, o juízo de admissibilidade da ação de improbidade administrativa constitui inovação trazida à lei pela Medida Provisória nº 2.225/45, regulada nos §§ 8º e 9º do artigo 17 da Lei n. 8429/92. É sempre feito com base na probabilidade ou possibilidade de concessão do provimento pleiteado, embora não seja juízo certo, posto que de cognição sumária, onde o juiz, à vista dos elementos até então produzidos, decide sobre a viabilidade da ação proposta.
No caso dos autos, a petição inicial preenche todos os pressupostos de admissibilidade da Ação de Improbidade Administrativa, senão vejamos:
1. Autor e Réus são partes legítimas – ativa e passiva, respectivamente.
2. Estão demonstrados, por ora, o interesse processual e a tempestividade da ação;
3. Há indícios de cometimento de atos de improbidade administrativa. Isto porque, com as documentações trazidas aos autos, onde identifiquei sobretudo o Laudo Técnico NAT (registros nº 5110497, 5110515, 5110532), por meio do qual estão especificados os valores gastos com cada paciente, foi constatada a utilização de dinheiro público federal para o pagamento de tratamentos médicos particulares realizados junto ao Hospital Sírio Libanês, em ofensa aos princípios da legalidade, moralidade e impessoalidade, na medida em que sequer havia critérios para a verificação da possibilidade de realização dos procedimentos por aqueles beneficiados, pessoas abastadas que podiam pagar seus próprios planos de saúde, restando claro, portanto, que os pacientes não preenchiam o critério objetivo típico dos usuários do Sistema ùnico de Saúde – SUS : hipossuficiência a justificar o tratamento fora de domicílio (TFD) pago pelo Estado do Amazonas.
Tais assertivas foram corroboradas pelo depoimento de um dos requeridos, Sr. PEDRO ELIAS DE SOUZA realizado perante o Ministério Público do Amazonas (registro nº 5110621) em que o mesmo declara:
“(..) tratava-se de procedimento de praxe o envio de alguns pacientes pela SUSAM ao Hospital SÍRIO LIBANÊS, sendo comum a solicitação por parte de pessoas influentes; QUE era comum a cobrança de valores por parte do Sírio Libanês à SUSAM, via e-mail, como de regra (…); que nem mesmo na Secretaria havia um procedimento administrativo que analisasse e fundamentasse os tratamentos em questão (…)”.
Todos os réus foram Secretários da pasta de saúde à época dos respectivos fatos, sendo eles, em tese, responsáveis pela autorização ilegal que resultou nas despesas indevidas e geradas em detrimento do público usuário do SUS, já que se tratavam de autorizações de TFD (tratamento fora de domicílio) sem qualquer amparo legal e para pacientes sem perfil do SUS, bem como para atitudes que não integram política pública de saúde,
Importante ressaltar que os autos demonstram a natureza e origem da verba utilizada para pagamento dos tratamentos privilegiados no Hospital Sírio Libanês. As despesas foram custeadas com verbas federais destinadas aos pacientes do SUS – Sistema Único de Saúde, conforme demonstram os laudos da Controladoria Geral da União. Neste ponto, as provas demonstram que as contas utilizadas recebiam verbas federais, o que justifica inclusive a competência da Justiça Federal.
Tal situação informa os indícios de ato de improbidade que atenta contra os princípios da Administração Pública especificamente previsto em Lei, o que é suficiente para o recebimento da inicial, nos termos da lei de regência.
4. Por fim, ressalto que, em face do exposto na atual redação do artigo 17, § 11, da Lei 8.429/92, o juiz tem a alternativa de, em qualquer fase processual, reconhecer a inadequação da ação de improbidade e extinguir o processo.
Ressalto que as alegações dos Requeridos contidas em suas manifestações, tratam-se de argumentos de mérito, que, por si só, não são hábeis a afastar, de plano, a ocorrência de ato ímprobo.
Assim sendo, em razão de se encontrarem preenchidos todos os requisitos legais, deve a presente Ação de Improbidade Administrativa ser devidamente recebida.
Nesses termos, RECEBO A INICIAL. Tendo em vista que a intimação para a apresentação de manifestação escrita dos Requeridos já fez a ressalva na forma do Enunciado 12 da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados – ENFAM, desnecessária a sua citação, devendo-se tão-somente intimar os seus advogados constituídos para fins de contestação.
Determino a intimação da União para, no prazo de 15 (quinze) dias, manifestar-se quanto ao seu interesse em integrar a lide.
Apresentada a contestação, manifeste-se o MPF e a União, acaso deseje integrar a lide, em 30 (trinta) dias, devendo, na oportunidade, especificarem as provas que pretendem produzir, indicando suas finalidades. Caso requerida a produção de prova testemunhal, as qualificações devem ser apresentadas desde logo, com os respectivos endereços ou com o compromisso de que as testemunhas serão trazidas para a audiência independentemente de intimação.
Após, intimem-se os requeridos para, em 15 (quinze) dias, especificarem provas. Caso seja requerida a produção de prova testemunhal, as qualificações devem ser apresentadas desde logo, com os respectivos endereços, ressalvando-se que a intimação das testemunhas obedecerá o determinado no art. 455 do novo CPC.
Transcorrendo o prazo sem requerimentos, após nova vista ao MPF, venham-me os autos conclusos para sentença.
Publique-se. Intimem-se.
Foto: Reprodução Internet/Sírio Libanês