MANAUS – Em sua segunda disputa eleitoral, a primeira majoritária, o advogado Marcelo Amil aposta em uma pesquisa que dá conta de que mais de 60% do eleitorado quer um prefeito que não tenha ocupado mandatos eletivos para ocupar a partir do ano que vem a cadeira deixada por Arthur Virgílio Neto (PSDB).
Filiado ao Partido Comunista do Brasil (PCdoB), Amil faz até elogios à gestão tucana na Prefeitura de Manaus, mas diz que é preciso uma mudança de filosofia, de paradigmas da gestão.
Na entrevista ao ESTADO POLÍTICO, entre outras coisas, ele descarta a estatização do sistema de transporte público e defende parcerias com a iniciativa privada para a gestão da saúde.
Amil detalha o que pensa sobre os problemas da cidade, aponta os caminhos que considera ideais para resolvê-los e também fala sobre política partidária.
Confira abaixo trechos da entrevista em texto e vídeo:
EP – Gostaria de começar com a questão das finanças do município. Qual é a avaliação que o senhor tem da gestão financeira dos oito anos de mandato do atual prefeito? Qual o legado que fica para o próximo prefeito e o que vai dar para fazer?
MA – Nós montamos um grupo de trabalho específico para discutir as finanças do município e, curiosamente, a gente descobriu que na pandemia houve um acréscimo de receita, de 500 milhões de reais que sequer foram utilizados. A gente não vai adotar na campanha uma estratégia de terra arrasada, que está tudo horrível, não. Há coisas que funcionam e o que funciona precisa ser mantido para ser, inclusive, aprimorado. A política fiscal do município tem funcionado. O que a gente precisa é transformar esse 6,2 bilhões de arrecadação do município em obras que realmente mudem a vida das pessoas, que deixem legados de qualidade de vida. Esse vai ser o objetivo da nossa gestão.
EP – O senhor falou que coisas boas devem permanecer. O que mais o senhor pode elencar de ponto positivo na questão fiscal?
MA – A automatização dos mecanismos de arrecadação. Hoje, qualquer microempreendedor consegue do seu escritório, da sua oficina e até mesmo do seu celular emitir uma nota fiscal avulsa. Isso é positivo porque facilita a vida de quem está prestando serviço, facilita a vida do tomador de serviço e incrementa arrecadação do município, porque, quanto mais gente tiver pagando ISS, maior será a arrecadação, mais a prefeitura vai converter em serviço, mais vai poder dar qualidade de vida para a cidade.
EP – O senhor fala em priorizar obras. Consegue elencar algumas que o senhor acha serem fundamentais e que não foram feitas?
MA – O que a gente tem debatido muito não é a questão objetiva de obras, mas a mudança de paradigma. Por exemplo, se eu mudo um paradigma, eu mudo um direcionamento de obras que eu vou vir a construir. Um dos objetivos que a gente tem no nosso grupo de trabalho é levar qualidade ao transporte público. Como é que a gente vai mudar essa qualidade? Vamos mudar o paradigma. Hoje, Manaus tem apenas um modal, que é o transporte terrestre através de ônibus. Agente tem no nosso grupo de trabalho discussões sobre BRT, estudando modelos de Porto Alegre, estudando modelos de transporte público de Barcelona, a gente tem uma perspectiva, já encomendada, de um transporte aquaviário com Estações saindo da Colônia Antônio Aleixo, chegando até o porto do São Raimundo, uma outra possível estação no Tarumã, também fazendo essa integração ao Porto do São Raimundo. E, com isso, você tira ônibus das ruas, você desafoga o trânsito, você dá alternativa às pessoas e numa linha mais sutil, assim, você faz até um incremento para o turismo.
EP – O próximo tópico era realmente o transporte público. Eu queria saber o senhor acha do que foi implantado até aqui, tanto em termos de qualidade quanto da transparência dos gastos. O senhor acha que isso precisa ser atacado de alguma forma?
MA- Acerca dos gastos, eu discordo da forma de remuneração das empresas. Como é que empresa de ônibus recebe hoje? O usuário paga a passagem na catraca e esse dinheiro é revertido para o sistema. Eu discordo dessa metodologia. Numa gestão eventual do Marcelo Amil, o empresário vai ser remunerado por quilômetro rodado, ou seja, quanto mais ônibus ele coloca na rua para que o usuário pegue um ônibus menos lotado, para que o trajeto seja mais rápido, mais ele vai receber. Essa filosofia, nós entendemos que tem que ser alterada. Quanto à estrutura física, mais uma vez a gente volta para concepções.
A Prefeitura de Manaus construiu aquela parada gigantesca na Constantino Nery. Está construindo outras três, duas na Max Teixeira e uma no Manoa. Só que aquilo não vai mudar em nada vida do usuário porque ela não vai fazer eu chegar mais rápido do T3 à Constantino Nery, ela não vai fazer o ônibus chegar menos lotado. Então, a filosofia de concepção dela está errada. Ela simplesmente vai aumentar o tempo de trajeto, porque vai haver mais três paradas entre o T3 e o Centro de Manaus.
Mudando a concepção, muda o paradigma, a qualidade de vida. E tem uma outra coisa que eu acho fundamental também, que a gente discutindo muito na equipe, é que eu não posso discutir o transporte coletivo se eu nunca andei de ônibus. Não é o meu caso. Se você me solta lá do São Lázaro, na frente da igreja do São Vicente, eu sei pegar um ônibus e chegar na Ponta Negra. Os outros candidatos não sabem. Isso é diferencial. É conhecer o sistema, ter vivido nele.
Eu cresci numa casa de madeira, alugada no bairro da Raiz, na periferia. Eu ia de ônibus para escola, estudei em escola pública. eu cEntão, onheço os problemas de dentro, eu sei o que o usuário espera de solução e, enquanto gestor, eu tenho plena condição de buscar as ferramentas para implementar.
EP – O senhor falou em mudança de filosofia. O que o senhor pensa respeito da questão do subsídio? Ele é importante? Ele está no nível bom? Ele precisa ser ampliado ou tem que acabar?
MA – O subsídio ele é necessário com sistema que nós temos hoje. Por quê? Há duas décadas, todos os anos, a gente vê os empresários dizendo ‘deu prejuízo, deu prejuízo’. Primeiro que eu não acredito nisso. Por que empresário nenhum vai ficar 20 anos no ramo tendo prejuízo? Então, no momento em que o sistema, pelo menos oficialmente, é deficitário, deve sim haver o subsídio do poder público porque esse subsídio nada mais é que a garantia do preço da tarifa e o poder público tem recursos para isso.
Então, se há caixa disponível, a gente tem como segurar uma tarifa para que o usuário final possa, ao invés de gastar dinheiro com ônibus pagar uma tarifa mais cara, ter comida na sua mesa e ter um pouquinho de qualidade de vida, possa pegar sua família, seu filho e levar para a pracinha do bairro para comer um x-salada no domingo. Eu prefiro optar por isso. O subsídio, quando necessário, ele é fundamental. O que o mecanismo precisa fazer é eficientizar o sistema, criar ferramentas para que o subsídio seja cada vez menor, para que ele seja menos necessário, para que nós tenhamos o sistema superavitário.
EP – Sua campanha avalia alguma possibilidade de estatização do sistema do transporte público?
MA – Nesse momento não há essa discussão porque nos entendemos que o sistema tem condições de se manter, se ele for otimizado, se você tiver uma remuneração através de câmaras de compensação das empresas como é feito em Pernambuco, como é feito em diversas outras cidades do mundo, o sistema pode alcançar um equilíbrio superavitário e isso consequentemente vai reduzir a necessidade de subsídio. A estatização não está no nosso horizonte.
EP – A cobertura da rede de atenção básica de saúde, que é prioridade do município, não atinge níveis satisfatórios, digamos. Ela ultrapassa pouco mais de 50%. O senhor acredita que, com o orçamento que a prefeitura tem hoje, é possível reforçar essa atenção básica para níveis mais adequados?
MA – Eu acho que não se trata de ser possível, se trata de ser necessário. Na verdade, não é nem 50%. Nos últimos estudos que eu li estava em torno de 31% o atendimento de básica de Manaus, enquanto que a OMS recomenda que seja de pelo menos 72%. E não tem mágica, não adianta dizer ‘eu vou tirar o coelho da cartola, eu vou resolver’.
O caminho é você reforçar a presença dos profissionais nas casinhas de saúde, contratar quem tiver que contratar, se tiver que abrir concurso público para profissionais da área médica, abre concurso público, e garantir que a casinha funcione com equipamentos, que ela tenha qualidade, que não falte paracetamol, que não falte profissionais no seu plantão.
Estudos são ferramentas de gestão. A gente não quer reinventar a roda, a gente quer pegar roda que já tem e fazer ela funcionar com qualidade. Mas, o objetivo da questão da saúde é isso, é atingir o nível de recomendação da OMS de 72% de atendimento.
EP – E ir além disso, o senhor acha que é viável? Considera a construção de um hospital municipal, por exemplo, ou alguma coisa nesse nível?
MA – Esse é um sonho que a gente tem. Mas, estreitando parceria com a iniciativa privada e com financiamento internacional. Manaus, hoje, é uma cidade que em qualquer país do mundo que você chegue as pessoas conhecem Manaus. A ideia é ter profissionais específicos, preferencialmente oriundos da UEA, da Ufam, para trabalhar essa relação. Dubai tem investimentos do mundo inteiro, a China tem investimentos do mundo inteiro. Vamos discutir, vamos mandar profissionais para trazer investimento internacional para Manaus.
EP – Educação. Um dos grandes problemas da rede municipal hoje é a questão dos aluguéis. São muitos, são caros e se arrastam há vários anos. O senhor pretende acabar com isso? É possível construir escolas com orçamento que Manaus tem hoje?
MA – É possível construir um ponto que você otimiza a gestão e ao ponto você usa com inteligência os recursos. Dizer, qualquer um que chegar diz ‘ah eu vou acabar com os aluguéis’. Ou ele está mentindo, ou ele não tem noção do que é a gestão pública, porque, se eu desfaço um aluguel hoje, aonde eu vou colocar aquelas 250 crianças estudando lá? Então eu preciso manter o aluguel lá. Mas, eu preciso também manter esse aluguel a um preço de mercado. Não dá para pegar um prédio que no mercado custaria 15 mil de aluguel pagar 50 mil por ele. Essa auditoria em todos os contratos vai ser feita para que se pague um valor justo para quem está alugando seu patrimônio à prefeitura e que não se onere também o cofre do município além do necessário.
Aí, a gente volta para uma questão que a gente mudar o paradigma. Quando eu vejo essas três paradas que estão sendo construídas, o que eu penso? Será que não seria mais útil pegar esse dinheiro e construir uma creche no Manoa, uma na Compensa, construir uma escola de nível fundamental no Jorge Teixeira. Essa é a mudança de filosofia.
EP – A questão das creches também é outro problema histórico. Já houve promessa, salvo engano na campanha de 2008, de construção de mil delas e isso nunca saiu do papel. Hoje temos perto de 20. O senhor acredita que é possível e de que forma faria para ampliar a oferta de vagas para as crianças?
MA- A primeira questão é falar a verdade. Quando um prefeito chega numa campanha e promete ‘eu vou construir mil creches’, naturalmente eu já sei que ele está mentindo, porque é impossível, o município não tem recursos para isso e nem o Estado teria recursos para isso. A gente trabalha com razoabilidade.
Hoje, o desenho que está sendo programado por nós para Manaus é semelhante ao da oferta de Ensino Fundamental. Se eu precisar alugar prédios, eu terei que alugar prédios, alugaríamos. Agora, Manaus precisa ter no mínimo uma creche para cada dois bairros. Se tem uma creche de um porte razoável na Raiz, eu consigo atender Lagoa Verde, Petrópolis, uma parte do Japiim e até o São Francisco. Então, creches específicas em pontos estratégicos.
EP – O senhor citou no começo da entrevista o que considera positivo da atual gestão. Agora, eu queria saber quais são, na sua avaliação, os principais problemas da cidade, que precisam ser discutidos nessa campanha e que o senhor tem se debruçado para poder tentar resolver caso seja eleito.
MA – O problema central da cidade é a mudança de filosofia. Eu não posso, da Ponta Negra, entender verdadeiramente o problema do Jorge Teixeira. Eu não posso, de uma BMW, entender necessariamente o problema do transporte coletivo. Então, essa mudança de filosofia é o principal paradigma. Como eu te falei, lá da Ponta Negra se entendeu que devia construir mais duas paradas na Max Teixeira e uma outra na Torquato. Lá no Riacho Doce não é isso que eles acham, eles preferiam pegar o ônibus rápido no T3 e descer rápido na Constantino Nery. Mudando essa filosofia, vai haver uma ampliação de toda a filosofia de trabalho da gestão.
EP – O senhor fala de mudança de filosofia, de um outro olhar, diferenciado. Alguns pré-candidatos e candidatos falam em subprefeituras como uma forma de descentralização, justamente para ter esse olhar de lá da periferia. Isso é tratado na sua campanha? O senhor pensa em alguma proposta nesse sentido?
MA – A subprefeitura, tecnicamente ela já existe em Manaus, que são os distritos de obras. O que é subprefeitura? É a descentralização da administração com gestor responsável por uma área territorial.
EP – Mas nesse caso é só para obras…
MA – Sim, mas tecnicamente ela já existe. Se você avaliar, eu tenho um distrito de obras. Como é que eu transformo aquilo numa subprefeitura? Tendo ali alguém ligado à secretaria de Cultura, tendo alguém ligado à secretaria de Educação, para pensar todo o arcabouço ideológico da prefeitura para aquela área territorial. Isso já é feito e funciona com sucesso em São Paulo, em Nova Iorque, em Buenos Aires. Essa não é uma ideia nova. Quem propõe subprefeitura na verdade não está um passo à frente, está alertando que Manaus está um passo atrás. Felizmente a gente estuda bastante todo dia para saber que isso é tão consequencial, isso é algo tão básico, que a gente sequer propõe colocar essa discussão. Não é algo que alguém tem que propor e receber aplausos. É algo que precisa ser feito e que já está, inclusive, contemplado no nosso plano de governo.
EP – Eu queria saber qual que é sua posição a respeito de um tema que é muito controverso aqui na cidade que a questão das ocupações irregulares. Há vários aspectos envolvidos na temática, como a falta de moradias, tem a questão ambiental, urbana (a falta dela nesse caso). Qual é a sua visão sobre isso? E de que forma o prefeito Marcelo Amil trataria essa questão?
AM – Primeiramente, separando o joio do trigo. Eu tenho que separar quem está nessas ocupações que realmente não tem teto para colocar seus filhos para dormir e quem está lá porque quer ganhar um terreninho para dali a cinco anos vender esse terreno por 5 mil reais. Quem está ali querendo conseguir um terreninho para dali cinco anos vender é caso de polícia. Aí é com a Polícia Civil, com a Procuradoria Geral do Município, se for o caso vai ter denunciar, vai fazer todas as providências necessárias.
Agora, aquela pessoa que está ali querendo um pedacinho de terra porque não tem onde colocar o seu filho para dormir com dignidade, essa pessoa precisa ser acolhida pela prefeitura. Nós vamos estimular as ocupações? Não. Mas Manaus toda cresceu numa série de irregularidades. A Zona Leste praticamente toda, cerca de 73%, sequer está titulada, porque foi toda invadida e consolidou-se.
O que a prefeitura precisa fazer é dar o suporte necessário para o estado tomar as devidas providências, separando quem precisa de terra e quem é oportunista. E onde houver uma ocupação que o estado entender que ele pode ceder o terreno, daí a gente tem que agir para colocar a qualidade de vida, para levar esgoto.
Manaus tem hoje 82% da cidade sem atendimento de esgoto. Isso é um problema absurdo porque gera doenças, afeta a saúde básica, que, por consequência de problemas maiores de necessidade, já tem de atendimento médico, de atendimento de alta complexidade e as coisas estão interligadas. Se você muda o paradigma, você consegue fazer o efeito dominó positivo. Agora, eu repito, não é da Ponta Negra que você enxerga isso, é da Raiz, é do Japiim, é do Tancredo Neves.
EP – Candidato, eu queria voltar à questão da mobilidade para encerrar essa parte de propostas e problemas da cidade. A gente falou um pouco sobre a questão do transporte público, mas a mobilidade envolve uma série de outras questões. Eu queria saber a respeito do trânsito. O tempo perdido hoje nos congestionamentos de Manaus é muito grande, embora a pandemia tenha ofuscado um pouco isso nos últimos meses. O senhor tem alguma proposta específica, algum projeto que, se não vai resolver, possa pelo menos amenizar o problema a curto prazo?
MA – Não existem soluções simples para problemas como esse. Manaus tem em média 300 carros emplacados por mês, o que dá 3 mil e 600 novos carros emplacados todo ano. Manaus precisa discutir seriamente a abertura de novas vias e um transporte público de qualidade também ajuda nisso, porque se eu tenho transporte público de qualidade eu posso pensar ‘poxa, mas eu sei que eu vou sair do Santos Dumont, eu vou conseguir pegar um ônibus na Torquato Tapajós, ele não vai tá lotado então eu não vou suar eu vou chegar em 8 minutos do Centro, eu não preciso tirar meu carro pra rua’.
Isso faz toda diferença e muitas pessoas, muitos comerciários do Centro, que tem seu carro próprio, eles chegam ao Centro passam o dia trabalhando e depois vão para casa. Eles não vão de ônibus porque eles não têm um transporte público de qualidade. Então isso gera impacto. Se eu consigo dividir o modal de transporte com, por exemplo, esse terminal hidroviário na Colônia Antônio Aleixo, fazer esse terminal hidroviário no Tarumã com uma ligação para Centro, eu diminuo substancialmente a necessidade do trânsito de ônibus nesse trajeto, então eu ajudo a desafogar o trânsito da cidade.
Agora, qual é a principal contribuição que a gente entende que deve ser dada? Manaus tem professores doutores na Ufam, na UEA, nas universidades particulares que moram em Manaus, que vivem em Manaus a vida inteira e que estudam os problemas. Vamos chamar esses professores, vamos chamar o departamento de estatística, vamos chamar o departamento de engenharia, para nós discutir soluções para Manaus feitas por quem mora em Manaus, ao invés de trazer, como no caso do viaduto do Manoam uma solução pré-moldada do Estado de São Paulo para simplesmente fazer uma foto bonita. A foto vai ficar bonita, mas a qualidade de vida das pessoas, que é o que realmente interessa, vai cair.
EP – Eu queria saber como é que seria a relação de um eventual mandato seu na prefeitura com a Câmara Municipal. Como fazer para aprovar projetos e dar andamento às questões da cidade? Como seria esse diálogo?
MA – De absoluto respeito. Eu sou um democrata e acredito na repartição de poderes. Então, o diálogo com a Câmara será respeitoso, no sentido de se a gente vai enviar o projeto nós vamos ter a humildade de ouvir o Parlamento. Se o parlamento falar ‘prefeito, a gente precisa mudar aqui, a gente precisa melhorar aqui, prefeito a câmara entende que esse projeto não é bom para Manaus nesse momento’, nós vamos respeitar, porque os votos que o prefeito recebe eles têm a mesma legitimidade que os votos que os vereadores recebem. A Câmara de Manaus deve ser respeitada, deve ser tratada com altivez e com a devida respeitabilidade que estado democrático exige.
EP – E como fazer para conseguir uma base de apoio não elegendo o número substancial de vereadores do próprio partido?
MA – Nós acreditamos substancialmente que elegeremos entre 3 e 4 vereadores do nosso partido. Não é suficiente, não constrói uma base. O que é que constrói uma base parlamentar? Primeiro, aquilo que eu falei o respeito democracia, a discussão com os 41 vereadores, o respeito à Mesa Diretora e o atendimento de prorrogativas. É inadmissível que um vereador por ser de oposição faça um requerimento à prefeitura e o secretário leve 20 dias para responder. Não! Ele é de oposição? Que bom que ele é de oposição. Aí eu me remeto a Santo Agostinho, que falou ‘eu prefiro aqueles que criticam, pois me corrigem, aqueles que me bajulam, porque me corrompem’. Vamos respeitar a câmara, respeitar a oposição, como na democracia deve ser. E nós temos consciência de uma câmara respeitada, um vereador que sabe que seu trabalho é visto com a altivez que ele merece ter, que a Constituição conferiu, ele vai botar o que for necessário para Manaus dentro do seu entendimento, com todo respeito, dentro de um ambiente democrático.
EP – Sendo eleito, o senhor vai encontrar no poder os mandatários do Executivo das outras esferas, governador e presidente, que são esses que já estão aí. Qual avaliação que o senhor faz do atual governador e do presidente? E como que seria esse diálogo para tentar resolver os problemas da cidade?
MA – A partir do momento que você toma posse na Prefeitura Municipal de Manaus, não se trata mais das suas opiniões pessoais, se trata do que é bom para o povo de Manaus.Eu vou ter que conversar com o Governo do Estado? Óbvio. Eu vou ter que conversar com a Presidência da República? Óbvio. E farei porque isso é bom para Manaus. Manaus não vai se tornar uma ilha, Manaus não vai declarar a independência do Brasil, nós vamos ter relações republicanas relações administrativas. E essas serão sempre no limite do que manda a democracia.
EP – Hoje, como pré-candidato, como que é o senhor avalia os dois governantes?
MA – Eu entendo que o governo Bolsonaro tem cometido sucessivos erros. Sou oposição a ele, não nego isso. E agora o escudo, a muleta virou a economia: ‘ah, vai mal pela questão da pandemia’. Não vai. De 1º de janeiro de 2019 a 28 de fevereiro, o Real e a moeda que mais se desvalorizou no mundo em relação ao dólar, foi 5,62% de desvalorização, ou seja, antes da pandemia, isso mostra que a política econômica está equivocada. Eu não tenho também como homenagear e dizer que sou simpático ao governo que no início da pandemia propôs os trabalhadores ficassem em casa assistindo vídeo aula, aí ofereceu R$ 200 – graças à oposição nós conseguimos elevar o valor do auxílio emergencial para R$ 500, quando ele viu que pegaria mal e aumentou em mais R$ 100. Ótimo, que bom que teve sensibilidade. Eu queria que ele tivesse acolhido a proposta inicial da posição que era de um salário-mínimo. A democracia venceu ali. Então eu sou oposição ao Bolsonaro, entendo que ele comete diversos erros. Mas, onde ele acertar nós vamos elogiar, não tem problema algum.
Quanto ao governador Wilson Lima, eu entendo que ele pode fazer mais. Eu entendo que ele pode ir além. A conjuntura política do Estado, a micropolítica, tem suas especificidades, Ela tem suas peculiaridades, que eu acho até que seja diferente das demais conjunturas, porque o governador do Amazonas que se preocupar com Manaus, com a Cabeça do Cachorro (Alto Rio Negro), com Tabatinga, com Pauini. São realidades completamente diferentes, então isso gera dificuldade. A nossa intenção vai ser sempre colaborar com o governo, porque fazer algo diferente disso é trabalhar contra o Amazonas. Nós vamos trabalhar, mas vamos ser críticos. Vamos ser firmes, vamos falar ao governador ‘está errado nisso, a gente não acredita, vamos discutir em outra linha. Toda relação administrativa, quando é pautada por princípios republicanos, ela dá bons frutos ao povo.
EP – Qual avaliação que o senhor faz do manejo do Governo do Estado na pandemia? A atuação foi satisfatória?
MA – Mais uma vez eu entendo que poderia ter sido melhor. Faltou leitos. A gente teve um hospital de campanha construído pelo município, nós tivemos o hospital Delphina Aziz utilizado como centro de referência em tratamento à Covid, mas a gente poderia ter construído um hospital de campanha, que é algo relativamente simples, não precisava nem necessariamente ter uma UTI, mas nós poderíamos ter tido um na Zona Leste. Por que que alguém que mora na Cidade de Deus, que mora na quarta etapa do Jorge Teixeira precisava – já assustado porque não se tinha nem as informações que tem hoje – pegar o seu parente entrar no ônibus ir para o Terminal 4, pegar um outro ônibus ir para a Max Teixeira fazer integração temporal para chegar no Delfina Aziz lá perto da barreira? Isso aí foi onde o governo errou se havia possibilidades. Você tem terreno do Cecomiz ali perto da Bola da Suframa que tem uma área grande, ampla que pertence ao Governo do Estado, que poderia ter sido usado como um hospital de campanha, que facilitaria muito a vida das pessoas. O que faltou foi construir leito para atenção básica. É inadmissível que o governo veja pessoas morrendo em casa, levando até três dias para ter um corpo removido e o governo achar normal. Não é normal, não foram tempos de normalidade, podia ter sido feito muito mais para se combater a pandemia e infelizmente não se fez.
EP – Eu queria falar de política um pouco. O senhor, até o começo desse ano, era filiado de outro partido (o PMN), no qual promovia um movimento de transformação e de repente teve o comando tomado. O senhor foi pego de surpresa? Não havia um diálogo direto com a direção nacional desse partido?
MA – Eu fui convidado a ser presidente desse partido. Houve uma convenção em São Paulo, eu sequer era convencional, fui convidado a ir a São Paulo e lá o presidente me perguntou se eu gostaria de assumir a presidência do partido.
EP – Isso foi quando?
MA- Em julho de 2019 e eu falei ‘presidente, em que condições?’ E ele foi que me apontou ‘nosso partido é um partido socialista está lá no artigo segundo’. Eu falei tudo bem, então vamos trazer o PMN de volta para onde ele nunca devia ter saído. Começamos o trabalho, fizemos curso na periferia, fizemos curso no Bela Vista, no Puraquequara, no Paraíso Verde, levamos politização, montamos os segmentos LGBT, segmento de mulheres, segmentos de gênero, segmento de diversidade, construímos um trabalho efetivamente de formação política e deu resultado, tanto deu resultado que nós atingimos um patamar que nos permitiu apresentar uma pré-candidatura à Prefeitura de Manaus, que foi muito bem recebida pela sociedade.
E árvore que leva pedrada é aquela que tá dando fruto. Forças ocultas tentaram me seduzir, eu não aceitei porque os meus valores não estão à venda, eu sei no que eu acredito, eu tenho consolidados os meus valores e eu não estou à venda. Como não conseguiu se resolver por aqui, foram por cima e aí eu dormi no sábado presidente, acordei no domingo destituído. E no domingo eu fui dormir tranquilo de novo porque quem mudou não fui eu, quem mudou foi o partido, que me pediu para trazer o de volta para esquerda, me pediram para fazer um bom trabalho, sou consciente que eu fiz, tanto que quando eu saí o presidente municipal do partido à época, professor Luiz Carlos, e outros 50 militantes também decidiram sair do partido me acompanhar. E hoje em dia eu até falo com felicidade disso, porque que bom que aconteceu, porque graças a isso eu voltei para o primeiro partido da minha vida que foi o PCdoB.
Na minha juventude, na minha adolescência, eu fui criado no PCdoB, militei na UJS e voltar para casa foi uma satisfação muito grande. Quis o destino que eu voltasse e fosse conduzido a essa tarefa de disputar a Prefeitura de Manaus. Vamos fazer a tarefa da melhor forma possível, vamos mostrar para Manaus que pode ser diferente disso que ela é e que Manaus vai voltar a ser uma grande cidade do mundo, o que ela já foi lá no século passado.
EP – E para aquele eleitor tradicional de esquerda que já tem o Zé Ricardo como candidato, o que o senhor pode apresentar de diferente para aglutinar esse voto e ter chances de passar para um eventual segundo turno?
MA – Eu tenho respeito pelo Zé Ricardo, mas a diferença entre alguém que vem ocupando sucessivos mandatos há cerca de 15 anos e alguém que está chegando agora se apresentando ainda no primeiro momento para um debate político, ela é substancial. Respeito o Zé Ricardo, ele tem uma história com Manaus, que já o honrou com uma votação significativa. Agora, as pesquisas dizem que 61,3% do eleitorado de Manaus não quer votar em ninguém que já teve mandato. Então, é para esses que nós vamos falar, aqueles que já tem uma escolha que já optaram pelos Ricardo, ótima escolha, é um bom nome da esquerda. Agora. tem 61% dos manauaras que não querem votar nessa opção. é para eles que a gente vai falar. é com eles que a gente vai dialogar .é aí que nós vamos apresentar uma opção diferente.
EP – Então, o senhor é um ‘novo’ da esquerda deste ano, como foi um ‘novo’ da direita em 2018?
MA – Eu não sei se eu sou novo, porque eu faço militância desde os 17 anos.Nunca tive mandato público porque essa é a segunda eleição que eu vou disputar. O que eu sei é que eu sou capacitado. Eu tinha uma premissa na minha vida, que só disputaria eleições quando eu não dependesse da política para viver, para poder conservar minha independência, para poder falar o que acredito, para poder defender as ideias que eu tenho. Felizmente esse momento chegou esse momento de maturidade, de independência. Então, vamos oferecer respostas para Manaus;
EP – A esquerda hoje, principalmente partidos com o rótulo comunista, tem um sentido pejorativo para um segmento da sociedade em acensão por causa do bolsonarismo. É possível reverter isso? Como?
MA – Falando a verdade, mostrando para as pessoas que o prefeito de uma cidade ele não tem poder para mudar o sistema social, ele tem poder para garantir que o ônibus chegue mais rápido, para garantir que a Dona Maria lá da Colônia Antônio Aleixo que está desempregada possa fazer um churrasquinho e botar na frente da sua casa e vender. Eu não vou discutir aqui comunismo socialismo, capitalismo, eu vou discutir os problemas de Manaus, eu vou discutir as soluções para que o manauara tenha uma qualidade de vida melhor. Comunismo, socialismo, quem quiser discutir se a gente marca uma tarde pega o livro, vamos comparar com Adam Smith, vamos ler, vamos discutir tecnicamente, isso tem que acontecer, mas no momento adequado. Para Manaus, o que a gente tem que discutir é ônibus chegando mais rápido, é o ônibus não estando lotado, a Dona Maria podendo fazer um bolo e vender na porta da casa dela e tendo quem compre.
EP – E afinal por que o senhor quer ser prefeito?
MA – O que a gente tem proposto pAra Manaus é a mudança de paradigma. Eu cresci numa casa de madeira, alugada no bairro da Raiz. Não vou ficar fazendo proselitismo dizendo que passei fome, nunca passei um dia de fome na minha vida porque a minha avó que era ascensorista vendia bala de castanha e cupuaçu para não faltar o nosso pão com ovo e o nosso café com leite, e nunca faltou, mas também não passamos a pão de ló. Eu sei o que é pegar um ônibus no bairro para ir estudar no Centro, eu sei o que é ter que escolher se você vai de ônibus para casa ou se você vai merendar porque o dinheiro não dava para as duas coisas. Eu vim dessa realidade e é por conhecer essa realidade que eu tenho consciência de que eu posso apresentar as melhores soluções, que a gente pode tornar uma Manaus mais humana, com mais qualidade de vida.
Tem 61% do eleitorado de Manaus que já deixou claro em todas as pesquisas que não quer botar ninguém que já está apresentado aí. Vamos falar para esses 61% com humildade, com inteligência, estudando, trazendo soluções pra Manaus que são construídas por quem mora em Manaus, eu não vou buscar professores da USP, da UFRJ se eu tenho esses mesmos professores com essas mesmas qualidades aqui em Manaus tomando tacacá no Largo, comendo jaraqui no Mercadão. A solução para Manaus, ela está em Manaus. Nós somos uma cidade do mundo e nós vamos fazer Manaus voltar a falar de cabeça erguida com o mundo, porque é possível sim.