MANAUS – Depois de anunciar que daria uma pausa na vida política partidária, o deputado estadual Ricardo Nicolau (PSD) recuou da ideia e decidiu se lançar a um voo mais alto em 2020: disputar pela primeira vez um cargo majoritário – a Prefeitura de Manaus.
Dividido entre a carreira política e a empresarial, Nicolau figura no Poder Legislativo desde a década de 1990. Após uma pausa, no início dos anos 2000, o deputado retomou as disputas políticas, com mandatos seguidos na Assembleia Legislativa do Amazonas (ALE-AM) desde 2007.
Para o político, a experiência na iniciativa privada e os mais de 20 anos no Legislativo são boas credenciais para um prefeito. Para convencer o eleitor disso, Nicolau pretende mostrar que com ações certas, do regramento básico de qualquer empresa, é possível profissionalizar a administração pública.
“A gente tem que superar as burocracias com estratégias que possam ser planejadas. O planejamento no poder público vai vencer a burocracia”, defende Nicolau.
Abaixo, trechos da entrevista (texto e vídeo):
O serviço de transporte público em Manaus segue ruim. Há como melhorar esse sistema?
Tem duas coisas que correm juntos, transporte coletivo e trânsito. Se não tiver um trânsito fluindo, temos um transporte coletivo com baixa quilometragem. O grande desafio é aumentar a quilometragem. A gente tem que trabalhar para fluir o trânsito. Se você sincronizar os sinais [de trânsito], você já tem um resultado diferente. Se você tem as direitas livres, você já tem um resultado importante. Se para dobrar à esquerda você tem um recuo para não atrapalhar a via, você já tem algo importante. Se melhorar as vias na faixa da direita, você já tem um resultado importante. E a partir daí ter intervenções de novas vias. E fazer cumprir aquilo que é acordado [com as empresas de ônibus].
Acabou de ser do conhecimento público que em apenas seis meses a Prefeitura de Manaus repassou R$ 61 milhões para as empresas de ônibus conseguirem pagar suas folhas. A exploração do serviço é um mau negócio para esses empresários?
Não. Nossa tarifa não é a das mais baratas. Segundo, comparado com outras capitais, as distâncias percorridas não são grandes. Você pode pensar em subsídios para baixar a tarifa, agora não para investir o recurso no setor privado. O sistema tem que se pagar. Sou contra usar recursos públicos dentro de empresas privadas.
Fazer intervenções, como construção de novas vias, exige muito recurso. A prefeitura emprestou nos últimos anos mais de 2 bilhões, e administrou mais 25 bilhões de orçamento. Esse recurso poderia ter sido revertido em mais intervenções viárias do que de fato foi feito?
Acredito que sim. Não era rotina de Manaus recorrer a empréstimos. O orçamento da prefeitura vem em uma crescente. É preciso readequar as despesas. Porque o grande problema não é a arrecadação, porque ela acontece. O imposto é obrigatório e a arrecadação acontece. Só que ela tem que ter um compasso com as despesas. Eu preciso reduzir o custeio, as despesas, o máximo possível, para sobrar dinheiro para investimento.
Da estrutura atual da prefeitura, o senhor acredita que é possível enxugar mais para sobrar recurso?
A prefeitura é como uma grande empresa, que você precisa otimizar compras, por exemplo. Hoje, cada secretaria comprar papel de um fornecedor diferente. Isso faz um preço muito maior. Se você centralizar, você vai comprar em maior quantidade e com um preço muito menor. E é preciso que a administração passe confiança para o fornecedor, confiança de que ele vai entregar um produto e que vai ter um calendário para ele receber. É profissionalizar a gestão.
O IBGE divulgou semana passada estudo mostrando que o Amazonas é o primeiro estado a apresentar uma recuperação econômica, voltando ao nível pré-pandemia. Como postulante a prefeito de Manaus, isso lhe anima, uma vez que até então havia previsões pouco otimistas?
Nós somos um município que tem focado sua economia na indústria. Quando a gente começa a produzir aqui é para suprir uma necessidade de seis meses para frente do mercado consumidor. A economia se aquece aqui na indústria para poder chegar ao mercado consumidor. Isso é um bom resultado, que demonstra que o Brasil vai voltar com mais rapidez para sua economia. Do ponto de vista de Manaus, a gente está sempre à reboque. Precisamos fazer com que a economia aqui esteja mais fortalecida, com serviços mais fortes e com outras alternativas econômicas, alternativas que não sejam projetos mirabolantes que nunca saíram do papel. Utilizar o potencial econômico que o Amazonas tem para poder gerar emprego e renda.
Por exemplo?
O turismo. A Amazônia é o grande lugar que pessoas do mundo inteiro querem conhecer. Tem que ter uma estratégia. Mas para ter uma estratégia para trazer [turistas], tenho que está preparado. Polo de cosméticos, polo de remédios. Estamos ainda da mesma forma do passado. Mandando produtos da Zona Franca para fora e importando outros para o Amazonas. Precisamos inverter essa lógica. Passar a produzir mais produtos que consumimos e esse recurso ficar no Amazonas.
Como resolver a baixa cobertura de atenção básica em saúde em Manaus, considerando o subfinanciamento federal para custear equipes de saúde da família, por exemplo? Há solução para isso?
Sem dúvida. Existe um cálculo que a gente precisa fazer. Você mede a cobertura de acordo com a quantidade de equipes. Só que existe outra forma de você medir, que é pelo que a equipe produz. Manaus é uma das capitais que menos recebe recurso do governo federal, porque precisa produzir mais. O SUS como um todo não banca 100%, só que para isso você tem recursos do município. É preciso fazer com que essa cobertura chegue a, pelo menos, 80% da população, considerando que 20% têm cobertura de planos de saúde. É possível. E é preciso que o paciente [da atenção básica] possa dar continuidade ao tratamento. Não adianta o médico passar um exame para ele, ele entrar no Sirerg e o exame não ser feito. Propomos fortalecer a base, lincando aos CAIS (Centro de Atenção Integral à Saúde), que vamos propor. É uma unidade que tem ambulatório de especialidades, toda parte de imagem e laboratório. Ele dará suporte à estratégia de saúde da família para ter continuidade no tratamento. O município pode, mesmo não sendo obrigação constitucional, ajudar a diminuir filas de cirurgias. Se o município tem um hospital para dar suporte nessas cirurgias eletivas, vai cumprir um papel muito importante.
O grupo Samel fez uma parceria durante a pandemia com a Prefeitura de Manaus para a abertura do hospital de campanha. No final, houve um desentendimento público. O que houve? Foi superado?
É normal. Muitas vezes há conflitos, principalmente quanto tem a iniciativa privada querendo resultado, meta, eficiência, e o poder público tem a sua morosidade, as suas peculiaridades, a sua burocracia. E o momento de uma pandemia não é momento para burocracia. É momento de trabalhar e salvar vidas. Houve desentendimentos, mas já superados. O resultado final do hospital foi extremamente proveitoso. E se provou ali que é possível se fazer no setor público atendimento de qualidade.
Considerando essa diferença entre gestão privada e gestão pública, o senhor não teme encontrar dificuldade em um eventual governo, considerando que sua experiência é no setor privado?
Tem que haver o respeito à legislação, mas você tem que ter metodologias para agilizar os processos. Por exemplo, tem a metodologia do registro de preço em que você não precisa fazer compras todo mês, todo dia. Faz o registro de compra e vai buscando conforme a necessidade. Tem o pregão eletrônico que você pode fazer em cinco dias. Então agente tem que superar as burocracias com estratégias que possam ser planejadas. O planejamento no poder público vai vencer a burocracia.
Como está a conversa com o PSL?
Conversamos com o PSL e outros partidos. Sabemos que ninguém ganha uma eleição sozinho. A gente precisa de um grupo que possa levar a mensagem. Nós estamos construindo de forma coletiva com os partidos, mas com princípios. Não vamos abrir mão dos nossos princípios, lotear aquilo que não tem, fazer compromisso que Manaus não esteja em primeiro lugar. Não vamos aceitar comprometimentos que interfiram no futuro de Manaus. Quando você faz eleição comprometida com grupos políticos, com grupos empresariais, você compromete o futuro da cidade. Estamos fazendo alianças em cima de uma proposta para Manaus, poder fazer e trazer soluções diferentes. Todas as nossas alianças vão ser transparentes e vamos mostrar à sociedade o que nós queremos fazer de forma diferente.
Entre tantos “perfis” que se surgem nas eleições, como “novo”, “velho”, “preparado”, como o senhor vai se apresentar ao eleitor? Em qual deles o senhor se enquadra?
Depois de muitos descontentamentos com alguns políticos e com essas marcas, o eleitor de Manaus vai ser muito criterioso. Vai analisar muito, não só a história como a capacidade que ele tem de realizar. Acho que essa vai ser uma eleição que vai ter um critério muito grande. A população vai buscar alguém que possa enfrentar os problemas de Manaus e vencer. Acho que essa eleição não será pautada por um sentimento único, como foi a última, que tinha o sentimento do novo, de mudança radical. A população já cansou muito dos discursos, das campanhas feitas com bom marketing mais sem propostas, vazias.
A eleição de 2018, além do sentimento de mudança, foi polarizada entre direita e esquerda. O senhor acredita que as eleições municipais ainda terão essa polarização? O senhor se enquadra em qual lado, direita, esquerda, centro?
De centro, centro-direita. O Brasil tem mais de 30 partidos. O entendimento da população do que é esquerda, direita, centro, centro-esquerda, centro-direita, não é muito claro. A população não vota em partido, não vota em uma pseudo-ideologia partidária. Acredito que nessa eleição as pessoas estarão preocupadas com os problemas de sua cidade, com o futuro de Manaus. Então acredito que não vai haver muita discussão nesse plano [esquerda x direita], e sim o que Manaus precisa e merece.