MANAUS – Responsável por dois adiamentos do julgamento que pode resultar na cassação do registro de candidatura do prefeito reeleito de Coari, Adail Filho (PP), o desembargador Elci Simões já foi punido com censura pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) por beneficiar o pai de Adail Filho, o ex-prefeito Adail Pinheiro.
Em 2010, quando ainda era juiz, Elci recebeu censura por conta de seu envolvimento na absolvição de Adail pai em processo por compra de votos e abuso do poder econômico nas eleições de 2006.
Segundo o CNJ, Elci teria decidido o julgamento a favor do então prefeito, que estava empatado em dois votos a dois, em troca de benesses e credenciais para o desfile das escolas de samba do Grupo Especial do Rio de Janeiro de 2008. A Prefeitura de Coari, naquela ocasião, patrocinou o desfile da Grande Rio, que levou para a avenida o enredo: “Do verde de Coari, vem meu gás, Sapucaí!”.
Nesta quinta-feira (10), Elci, que não é membro efetivo do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-AM), mas suplente, foi convocado para a sessão virtual da Corte para preencher o quórum devido à ausência de titulares.
Alegando não ter tido acesso aos autos antes, ele pediu vistas e o julgamento foi adiado, já com três a favor da cassação da candidatura de Adail.
Na manhã desta sexta-feira (11), Elci declarou suspeição por questão de foro íntimo e o julgamento foi suspenso novamente por falta de quórum com a saída dele do processo.
A próxima sessão do tribunal está marcada para segunda-feira (14), quando outro membro da Corte deve ser convocado para atuar no lugar de Elci. A última sessão deste ano está marcada para o dia 18, que também é a data limite para a diplomação dos eleitos, ou seja, o “prazo fatal” para que o julgamento seja realizado.
O processo
O processo que o TRE-AM está julgando foi movido pela coligação “Ficha Limpa para Coari”, que teve como candidato Robson Tiradentes (PSC) – segundo colocado na disputa dos votos, e pelo cidadão Raione Queiroz. No recurso, eles questionaram a decisão do juiz 8ª Zona Eleitoral, Fábio Alfaia, de deferir o registro candidatura de Adail Filho.
O argumento para isso é que o prefeito eleito estaria tentando o terceiro mandato sucessivo dentro do núcleo familiar, contrariando o artigo 14 da Constituição Federal de 1988. Eles reforçam que em 2012 o pai de Adail Filho, Adail Pinheiro, foi eleito. Na eleição seguinte, em 2016, Adail Filho venceu. E em 2020 seria a terceira vitória do grupo.
A defesa de alega que Adail Pinheiro, o pai, não concluiu seu mandato (ele acabou cassado e preso por processos envolvendo crimes de corrupção e exploração sexual de menores). A cidade então foi administrada pelo vice, depois pelo presidente da Câmara Municipal, depois pelo vereador mais idoso e por fim o mandato iniciado em 2013 foi concluído por Raimundo Magalhães, que tinha ficado em segundo lugar na disputa pela prefeitura. Portanto, o mandato de Adail Pinheiro foi “precário”.
Assim, haveria uma ruptura do exercício do poder pelo grupo familiar, tese que também foi defendida pelo procurador Eleitoral, Rafael Rocha.
Eleições e renúncia
Eleito pela primeira vez em 2016, Adail Filho renunciou ao restante do mandato atual logo após as eleições alegando necessidade de se tratar da Covid-19.
Adail Filho venceu a eleição deste ano em Coari com 22.220 votos (59,45%). Robson Tiradentes recebeu 8.871 votos (23,74%). O vice-prefeito eleito é primo do prefeito.
Histórico
Pai do prefeito eleito, Adail Pinheiro foi prefeito de Coari por dois mandatos consecutivos, entre 2001 e 2008. Sua passagem pelo município mais rico do interior do Amazonas (por conta dos royalties da exploração de gás em Urucu) foi turbulenta. Após investigações da Polícia Federal, no âmbito da operação Vorax, em 2006, ele foi denunciado e condenado por crimes de corrupção e também por exploração sexual de crianças e adolescentes.
Adail passou quase três anos preso em Manaus por causa de uma condenação ocorrida em 2014 na Justiça Estadual por crimes sexuais contra menores, e depois ganhou direito ao regime semiaberto. Em 2018, ele voltou a ser preso, em processo que tramita na Justiça Federal envolvendo corrupção, mas ganhou o direito de recorrer em liberdade.
Em fevereiro deste ano, Adail Pinheiro voltou a Coari, onde participou de uma série de inaugurações da prefeitura e fez um discurso celebrando o seu retorno.
Apesar do histórico controverso, o clã mantém alta popularidade no município. E consegue arregimentar apoio amplo de vários caciques políticos.
Adail Filho foi eleito pela primeira vez prefeito em 2016, tendo a irmã, Mayara Pinheiro (PP), como vice. Em 2018, Mayara se elegeu deputada estadual.
Na eleição deste ano, o vice parente da vez é o primo Keitton Pinheiro (PTB), que era vereador.