MANAUS – Após análise técnica minuciosa, o deputado federal Marcelo Ramos (sem partido) e a Federação das Indústrias do Estado do Amazonas (Fieam) chegaram à conclusão de que o decreto sobre alíquotas da IPI publicado pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) no dia 30 de dezembro do ano passado não vai prejudicar o polo de concentrados de refrigerantes da Zona Franca de Manaus (ZFM) com redução de incentivos fiscais, como apontou a Associação Brasileira da Indústria da Cerveja (CERVBRASIL) em reportagem do Estadão Conteúdo publicada pelo site UOL.
De acordo com a reportagem, o decreto reduziria de 8% para 4% o crédito presumido de IPI do concentrado de refrigerante, o que impactaria o polo desse setor na ZFM, tornando-o menos competitivo. “A matéria fora avalizada pela CERVBRASIL, que é a entidade representativa da indústria de cerveja instalada fora da Zona Franca e sabidamente hostil à Zona Franca”, observou Ramos, em vídeo divulgado à imprensa nesta segunda-feira (3).
Segundo Marcelo Ramos, o entendimento técnico, tanto da Associação Brasileira da Indústria de Refrigerantes e de Bebidas não Alcoólicas (ABIR) como da Receita Federal do Brasil, é que, como anexo ao decreto há a publicação de todas as novas alíquotas e como a de concentrado de refrigerantes está publicada em 8%, “isso não trará nenhum impacto para o polo de concentrados da Zona Franca de Manaus”.
Em nota divulgada nesta terça-feira (4), a Fieam informou que em análise técnica em conjunto com a Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa) “não foi possível observar qualquer minoração dos incentivos fiscais”.
“O Decreto nº 10.923, de 30 de dezembro de 2021, aprova a Tabela de Incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados – TIPI e revoga, a partir de 01 de abril de 2022, outros decretos que promoviam modificações na referida tabela. Ao mesmo tempo em que revoga o Decreto nº 10.523, de 19 de outubro de 2020, o Decreto nº 10.923/2021 aprova a TIPI que harmoniza e consolida o tratamento ora vigente, fixando, diretamente na própria tabela, a alíquota de 8% (oito por cento) incidente sobre os produtos classificados no código 2106.90.10 Ex 01”, detalha.
“O decreto promulgado no último dia 30 de dezembro de 2021 meramente colige todos as alterações espaçadas e as formaliza em um único decreto, não implicando qualquer mudança no nível de incentivos fiscais do segmento de bebidas amazonense”, explica a Fieam.
A entidade afirmou que “permanece diligente quanto quaisquer ameaças que coloquem em risco a competitividade do nosso modelo e resultem em queda de emprego e renda para a população local”.
Marcelo Ramos também disse que seguirá vigilante “porque esse é um segmento que sempre sofre ataques de outros estados e do próprio Ministério da Economia. E nós precisamos defendê-lo, porque defendê-lo é defender os empregos dos amazonenses”.
O parlamentar alertou que qualquer instabilidade relacionada ao modelo ZFM e a esse polo específico é sempre muito sensível. “Tanto que a Pespi já foi embora da Zona Franca de Manaus para o Uruguai”, destacou.
Por que afeta a ZFM?
Em fevereiro de 2020, quando o atual percentual foi estabelecido (decreto presidencial 10.254/2020), a alíquota de 8% teria “prazo de validade” até 30 de novembro daquele ano, quando começaria a ser reduzida gradualmente até chegar em 4%, em 2022.
Após “erro de redação” em um novo decreto em outubro de 2020 e pressão da bancada amazonense e de empresários do setor, o percentual foi mantido em 8%, sem a gradação que reduziria ele ao patamar de 4%.
A alíquota do IPI dos concentrados está relacionada ao crédito gerado para abatimento de outros impostos federais na entradas dos produtos produzidos na ZFM em outros estados. Assim, quanto maior for a alíquota, maior será o crédito sobre produtos adquiridos, o chamado crédito presumido.
Alíquota maior, nesse caso, representa um crédito maior para ser descontado de outros impostos federais, o que por um lado gera menos arrecadação para a União e, por outro, estímulo à aquisição do produto.
Sendo menor, a alíquota gera mais arrecadação ao governo, mas acaba deixando o produto menos atrativo aos compradores.
Dessa forma, alterações no IPI dos concentrados afetam diretamente a Zona Franca de Manaus, cujo polo deste tipo de produto hoje é o único responsável por abastecer toda a produção de refrigerantes no Brasil.
A redução do percentual da alíquota, segundo representantes do setor, diminui a competitividade da ZFM, que fica menos atrativa à instalação e manutenção de indústrias.
Por outro lado, empresas que atuam no resto do país sustentam que o benefício dado ao polo de Manaus desequilibra a concorrência e por isso é injusta.
Políticos e empresários locais, por sua vez, sustentam que o incentivo para o polo, assim como os demais da ZFM (que, aliás, são constitucionais), são importante por conta das desigualdades regionais que existem no Brasil, onde o centro-sul brasileiro leva vantagem por ter, por exemplo, uma melhor logística para escoamento da produção, maior PIB e melhores indicadores sociais. Outro argumento usado é de que a ZFM, ao gerar emprego e renda, evita que os amazonenses explorem de forma desenfreada a floresta, assim, preservando-a.
Idas e vindas
Em 2018, o governo de Michel Temer (MDB) reduziu de 20% para 4% a alíquota do IPI dos concentrados. A ação visava compensar as medidas que o governo federal teve de tomar para baixar o diesel em meio à greve dos caminhoneiros.
Após pressão da bancada amazonense no Congresso, que em sua maioria era aliada, Temer voltou atrás e em setembro deixou em 12%.
Depois, o governo Bolsonaro manteve em 10%, ao longo de 2019, até reduzi-lo a 8% neste ano e criar um mecanismo de redução gradativa (até o patamar de 4% em 2022), que foi extinto pelo novo decreto, retificado nesta manhã.
Impactos
No início do ano, multinacionais do segmento que atuam em Manaus, como a Coca-Cola e Ambev, afirmaram que a redução para 4% inviabilizará a manutenção de suas unidades na capital amazonense.
Em 2018, quando da redução promovida por Temer, a Pepsi anunciou sua saída o Polo Industrial de Manaus (PIM).
O setor gera receita anual de mais R$ 9 bilhões no Amazonas, conforme estudos da Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa), além de cerca de 800 empregos diretos e pelo menos seis mil indiretos, nos cálculos de parlamentares.
Além das fábricas, a cadeia produtiva envolve, por exemplo, o cultivo do guaraná de Maués.