Por Lúcio Pinheiro e Janaína Andrade |
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aplicou pena de “censura” ao juiz e ex-titular da comarca de Coari (a 363 km de Manaus), Fábio Alfaia, em um Processo Administrativo Disciplina (PAD) que mantém o magistrado afastado das suas funções desde março de 2023.
No julgamento, realizado no último dia 16, o CNJ suspendeu a decisão do ano passado que afastou Alfaia da função. Na época, ele já atuava em Manaus.
No processo, o Ministério Púbico Federal (MPF) acusava Alfaia de ter retardado o andamento processual de uma Ação Penal em que um dos réus era o ex-prefeito de Coari, Adail Filho, hoje deputado federal.
O MPF também apontava no PAD que o juiz tomou decisões no processo mesmo não sendo mais competente para julgar a causa. Para o órgão ministerial, as ações do juiz teriam beneficiado o grupo político do ex-prefeito.
Na sua manifestação durante o julgamento, o subprocurador-geral da República José Adonis sustentou a acusação, pedindo uma pena de disponibilidade (afastamento das funções) ao juiz, pelo período de 60 dias.
“Simplesmente, o magistrado aqui, entre idas e vindas, decisões contraditórias, ficou com o processo na vara de 2016 a 2019”, afirmou Adonis.
“Com base em tudo que foi apreciado, sobretudo pelo CNJ na instauração do PAD, reitero a manifestação escrita, no sentido da procedência das imputações e aplicação da sanção de disponibilidade, considerando a jurisprudência mais recente, que fixa prazo para a aplicação pelo CNJ”, completou.
Voto do relator
Para o relator do PAD, o conselheiro Marcello Terto, o processo ficou, sim, parado por injustificáveis 240 dias, mas não de forma deliberada para beneficiar os réus. Mas sim por falta de estrutura e capacidade técnica da unidade judiciária, o que não tira a responsabilidade de Alfaia.
Segundo Terto, por esse motivo, apenas, ele entendeu que Alfaia deve ser punido com a sanção de “censura”.
“Ocorre que entre a nomeação do promotor e a retomada do andamento do processo houve uma parada injustificada de 240 dias. E é por esse motivo que reconheço a responsabilidade disciplinar do magistrado por má gestão de sua unidade judiciária em relação a este processo. Não há nenhum elemento extra autos que justifique o reconhecimento de uma infração mais grave”, declarou o conselheiro.
Para Terto, a longa tramitação da Ação Penal na comarca de Coari se deveu a recursos das partes, entre elas o Ministério Público Estado (MP-AM), que teria iniciado um “tumulto processual”.
“Não importa o motivo. O tumulto processual começou com oposição dos embargos de declaração no lugar da interposição do também cabível recurso em sentido estrito pelo MPE-AM contra decisão que não recebeu a denúncia ante o vício”, afirmou Terto.
O relator concluiu que todas as decisões de Alfaia no caso foram embasadas na jurisprudência da época.
O conselheiro afirmou ainda que as acusações do Ministério Público não passam de “inconformismo” com o resultado das decisões do juiz.
“Pelo esforço para demonstrar que o magistrado processado teria violado os seus deveres funcionais de prudência e independência, verifica-se que a posição do Ministério Público está amparada apenas em questões subjetivas, contra atos de cunho eminentemente jurisdicional, sem, contudo, evidenciar a prática de qualquer infração funcional relacionada a aspectos extra autos, que efetivamente indicassem o favorecimento alegado”, completou Terto.
Defesa
O advogado Robson Halley Rodrigues, que defendeu Fábio Alfaia no PAD, ao fazer sua sustentação oral, pediu que não fosse aplicada nenhuma pena ao cliente.
Segundo ele, Alfaia tentou por várias ocasiões enviar o processo à Segunda Instância. No entanto, diante dos recursos das partes, o processo seguiu sob sua responsabilidade.
Robson também defendeu que todas as decisões que o cliente dele tomou foram com base na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
“É bem verdade que o processo ficou mesmo 2 anos e 9 meses lá no 1º grau. Mas julgando embargos de declaração opostos pela parte. O que ele [juiz] teria que fazer? Proibir a parte de recorrer?”, indagou o advogado.
“Não há nesses autos nada, absolutamente nada, do ponto de vista probatório, que leve à compreensão que o magistrado agiu com dolo ou culpa grave nessa demora desse processo chegar ao Tribunal [de Justiça do Amazonas (TJ-AM)]. Nada, a prova é toda em sentido diverso […]. Esse magistrado é injustiçado sobre esse prisma de que teria retido esse processo na origem. De novo [repito], com várias determinações de remessas e com decisões no processo, com base em jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça”, completou o advogado.
Censura
A censura é uma das penas disciplinares às quais os magistrados estão sujeitos e é considerada uma punição intermediária. Segundo a Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman), o juiz que recebe a pena de censura fica proibido de ser promovido por merecimento por um ano.
Disponibilidade
A disponibilidade é a segunda sanção mais grave prevista na Loman, abaixo da aposentadoria compulsória. Nela, o magistrado fica afastado das funções, mas recebendo.