MANAUS – O vereador Reizo Castelo Branco (PTB) afirma que o projeto, de sua autoria, que propõe a criação de um “Cadastro de Pedófilos” é inspirado em proposta da colega de partido, deputada federal Cristiane Brasil (PTB/RJ), que também defende, na Câmara dos Deputados, lei que crie um “Cadastro Federal de Informações para a Proteção da Infância e da Juventude”, também batizado de “Cadastro de Pedófilos”.
“Conversei com a Cristiane Brasil sobre o projeto, ela está criando o cadastro nacional, e o objetivo de apresentar o projeto aqui (na Câmara Municipal de Manaus) é chamar o tema à discussão, chamar a atenção da opinião pública. Esse cadastro, por exemplo, poderá ajudar no trabalho dos conselhos tutelares”, justificou Reizo.
Cristiane Brasil é filha do presidente nacional do PTB, o ex-deputado federal Roberto Jefferson. Em seu projeto, a parlamentar específica que o cadastro ficará sob a responsabilidade da Secretaria da Segurança Pública, que disciplinará a criação, a atualização, a divulgação e o acesso ao cadastro, que deverá conter a identificação, fotografia atualizada, circunstâncias e local em que o crime foi praticado e endereço atualizado do “agente”.
Segundo ela, a população terá acesso somente ao cadastro de pessoas com condenação transitada em julgado, ou seja, quando não cabe mais recurso. “As informações sobre pessoas investigadas, indiciadas, processadas e condenadas, sem trânsito em julgado, só poderão ser disponibilizadas mediante convênio com os entes federados, por meio de sistema informatizado com acesso restrito e uso exclusivo a determinadas autoridades e agentes dos órgãos de segurança pública, aos membros do Ministério Público e do Poder Judiciário”, diz o parágrafo 2º do projeto de lei de Cristiane. O projeto de lei de autoria de Reizo não detalha quais critérios ou quem poderá ter acesso ao site.
Inconstitucional
Para o professor de Direito Eleitoral e presidente da Comissão de Estudos Constitucionais da OAB/AM, Yuri Dantas, o projeto de lei apresentado pelo vereador Reizo é inconstitucional e possui uma “série de problemas”.
“O primeiro deles é confundir pedofilia com os crimes previstos nas regras mencionadas em seu artigo primeiro (produzir vídeos com cenas de sexo com crianças e adolescentes). Pedofilia é uma doença, cujos comportamentos patológicos podem ou não ser exteriorizados. Isto posto, feriria a dignidade da pessoa humana, protegida pelo art. 1º, III da Constituição, estigmatizar alguém pelo simples fato de ser doente”, analisa Dantas.
Na avaliação do professor, um dos pontos que não estão claros na proposta do vereador é se a inclusão no cadastro só será realizada após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.
“Aliás, o trânsito em julgado, segundo penso, seria o mínimo exigível para a inclusão no cadastro. E mesmo ele, igualmente na minha compreensão, não seria suficiente para afastar a ofensa ao princípio da dignidade da pessoa humana, porque julgo ser medieval a estigmatização, tal como ocorria com as mulheres adúlteras, que tinham os lábios, narizes ou as orelhas cortados, de modo que todos soubessem, por onde quer que passassem, que haviam se comportado daquela maneira”, avalia Yuri.
O professor de Direito Constitucional e pesquisador de Combate à Violência em Manaus pela Universidade do Estado do Amazonas (UEA), Neuton Alves de Lima, diz que essa é mais uma lei sem aplicabilidade e que, principalmente, avança sobre matéria (Direito Penal) que o município não tem competência para legislar.
“O Município, no caso, a Câmara Municipal de Manaus, não possui competência para tratar dessa matéria, porque é uma matéria penal. A pena na matéria penal é a principal e a secundária, essa proposta é uma pena secundária, a principal é a prisão. Mas seja a principal ou seja a secundária, só quem pode tratar de matéria penal é o Congresso Nacional, ou seja, a União. Então podemos dizer que o município não pode fazer isso – chegar e invadir algo que é de competência exclusiva da União”, comenta o pesquisador.
O professor alerta que o Direito Penal não pode ser utilizado como “panaceia”, ou seja, algo que tente remediar vários ou todos os males. “Se esse projeto avançar nas comissões e for aprovado pela CMM e em seguida sancionado pelo prefeito, poderá ser questionado na Justiça a sua inconstitucionalidade”, afirma Neuton. / J.A.