MANAUS – O prefeito de Manaus, David Almeida (Avante), falou nesta quarta-feira (10) sobre o questinamento que o Tribunal de Contas da União (TCU) fez à Secretaria Municipal de Saúde (Semsa) se a pasta foi pressionada pelo Ministério da Saúde a tratar pacientes com Covid-19 com os remédios como cloroquina, hidroxicloroquina e ivermectina.
Os medicamentos não têm eficácia comprovada cientificamente no tratamento da doença. Apesar disso, desde o início da pandemia o governo Bolsonaro incentiva o uso dos remédios no combate ao coronavírus, embora tenha sinalizado a mudança no discurso dadas as possíveis implicações político judiciais que a conduta possa resultar.
A jornalistas, durante entrevista coletiva nesta manhã, David Almeida comentou sobre o assunto ao ser perguntado sobre o pedido do TCU. O prefeito disse ainda não estar inteirado da solicitação do órgão de controle.
Ele negou que a prefeitura tenha adotado o “tratamento precoce”, embora anteriormente já tenha anunciado a distribuição de um “kit-covid”, que incluiria medicamentos como azitromicina, ivermectina e vitaminas. Um assessor da Semsa revelou, inclusive, a intenção de distribuir o tal kit na Arena Amazônia ou no Sambódromo.
Confira o que disse o prefeito nesta manhã:
“O que se fala de tratamento precoce… houve muita falácia sobre isso. Quando nós entramos na prefeitura, no dia 1º, o que se comentava é que as pessoas estavam procurando as nossas unidades básicas já no 8º, 10º dia, aonda a unidade já não podia tratá-las, aí foi feito uma propaganda. Nós fizemos uma propaganda que dizia o seguinte: não espere sentir falta de ar, nos primeiros sintomas procure uma unidade de saúde e faça seu teste, e você já inicia o tratamento. Tratamento precoce para Covid é máscara e distanciamento social. Você iniciar o tratamento da Covid no início, você está ajudando para com que essa inflamação ela não possa evoluir. Eu ainda não soube dessa questão (do TCU), mas nós não trabalhamos com a questão do tratamento precoce. Nós trabalhamos com a questão do tratamento no início dos sintomas. Então, que seja separado o início dos sintomas com o tratamento precoce, até porque o tratamento precoce, como tenho falado, é higienização, é máscara, distanciamento. Eu particularmente tomo minhas vitaminas. É isso que a gente tem feito para ter uma imunidade maior”.
O contexto
Na sexta-feira (5), o ministro Benjamin Zymler, do TCU, deu 10 dias para a Semsa informar se foi pressionada pelo Ministério da Saúde a tratar pacientes com Covid-19 com os remédios como cloroquina, hidroxicloroquina e ivermectina, que compõe o “tratamento precoce” preconizado pelo bolsonarismo sem base científica.
No dia 4 de janeiro, em Manaus, a secretária de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde do Ministério da Saúde, Mayra Pinheiro, defendeu o uso da cloroquina (sem citar expressamente o nome do medicamento) no tratamento precoce da Covid-19. Ela foi além e fez um apelo aos profissionais da medicina no Amazonas para que eles prescrevam o medicamento para paciente diagnosticados com o coronavírus.
“E aí você que está nos assistindo e que tem medo, porque a gente ouve na imprensa, a gente ouve em alguns veículos, que prestam mais desinformação do que informação séria, dizendo que essas medicações não funcionam e hoje a gente já tem evidências científicas suficientes, inclusive avaliadas pelo Conselho Regional de Medicina do Estado do Amazonas, fazendo com que a gente possa ter muita tranquilidade que você possa receber medicamentos que vocês aqui no Amazonas já usam há muito tempo para tratamento da malária, com baixíssimo risco de causar efeitos colaterais”, disse ela, na ocasião.
Dias depois, também em Manaus, na véspera do colapso do oxigênio, o ministro Eduardo Pazuello falou sobre o assunto, de forma cifrada. Disse que a vacinação seria uma estratégia auxiliar de combate à doença, mas que a prioridade do governo federal era o “tratamento precoce”.
“Senhores, senhoras, não existe outra saída! Avisei ontem o Wilson (Lima, governador do Amazonas pelo PSC) que hoje eu seria mais incisivo em algumas palavras. Nós não estamos mais discutindo se esse profissional ou aquele concorda ou não concorda”, disse Pazuello.
Para justificar a defesa ao chamado tratamento precoce, o ministro citou orientações dos Conselhos Regionais de Medicina favoráveis à prescrição de medicamentos.
“Os conselhos federais e regionais (de medicina) já se posicionaram, os conselhos são a favor do tratamento precoce, do diagnóstico clínico”, emendou.
“A orientação é precoce. Então, os diretores dos hospitais devem cobrar na ponta da linha da UBS como o médico está se portando. O cara tem que sair com um diagnóstico, até porque a medicação pode e deve começar antes dos exames complementares. Caso o teste depois der negativo por alguma razão, reduz a medicação e tá ótimo, não vai matar ninguém, agora salvará no caso da Covid”, prosseguiu.
“Existe a liberdade e a necessidade do tratamento individualizado, cada paciente e médico tem um nível de conhecimento e cuidado que pode mudar o tratamento, mas o tratamento tem que ser imediato e os medicamentos têm que ser disponibilizados imediatamente. O paciente precisa se medicar e ser acompanhado pelo médico, essa dúvida não existe”, disse Pazuello.
Durante a estadia de Pazuello da capital amazonense, o site UOL revelou que o MS estava pressionando profissionais da prefeitura a prescreverem o “tratamento precoce”. O site divulgou um ofício encaminhado pelo MS à Semsa.
No documento, o ministério afirma ser “inadimissível” não usar as medicações e pedia autorização para que Eduardo Pazuello fizesse uma ronda nas UBS “para que seja difundido e adotado o tratamento precoce como forma de diminuir o número de internamentos e óbitos decorrentes da doença”.
“Aproveitamos a oportunidade para ressaltar a comprovação científica sobre o papel das medicações antivirais orientadas pelo Ministério da Saúde, tornando, dessa forma, inadmissível, diante da gravidade da situação de saúde em Manaus a não adoção da referida orientação”, diz o ofício.
Nas últimas semanas, após a própria Anvisa afirmar que os medicamentos são ineficazes, tanto Pazuello quanto Bolsonaro têm negado que recomendaram o uso dos medicamentos.
Milhares de comprimidos
Em ofício ao Supremo Tribunal Federal (STF), no mês passado, a Advocacia Geral da União (AGU) informou que o governo federal mandou 120 mil comprimidos de hidroxicloroquina para Manaus.