MANAUS – Com dificuldades, a base governista na Assembleia Legislativa do Amazonas (ALE-AM) conseguiu nesta quarta-feira (6) manter o veto do governo ao projeto de lei aprovado pela Casa que proibiria a apreensão de veículos com IPVA atrasado. A lei previa ainda que o Estado deveria disponibilizar mecanismos para a cobrança separada do Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) das taxas e do licenciamento anual.
A discussão durou mais de uma hora. O parecer do relator, Delegado Péricles (PSL), foi pela derrubada do veto ao projeto de Wilker Barreto (Podemos). Além de Wilker e Péricles, votaram contra o veto os deputados Serafim Corrêa (PSB), Dermilson Chagas (Podemos), Ricardo Nicolau (PSD), Fausto Júnior (MDB), Sinésio Campos (PT), Therezinha Ruiz (PSDB) e Tony Medeiros (PSD).
Governista, Carlinhos Bessa (PV) ensaiou votar contra, mas na hora “H” recuou e resolveu se abster. A maioria, no entanto, aprovou a manutenção do veto.
Por conta do tulmulto na sessão, não foi possível ainda identificar nominalmente todos os votos. Pouco antes de aferir a votação, o presidente da Casa, Roberto Cidade (PV), contabilizou 13 deputados presentes no plenário e virtualmente. Antes disso, chegou a faltar quórum para a votação prosseguir.
Wilker pediu que fosse usado o novo painel eletrônico para que os nomes dos que votaram a favor da derrubada do veto fossem expostos.
Cidade negou. Disse que o painel é novo e que levaria um bom tempo para que a equipe técnica ajustasse o equipamento para que ele funcionasse com plenitude, o que atrapalharia o andamento da pauta de votação.
Dermilson sugeriu a leitura nominal dos votos. Cidade novamente negou e disse que o presidente, no caso ele próprio, decidiria a melhor forma de votar. Wilker insistiu e Cidade respondeu.
“Quem tá presidindo sou eu”, disse Cidade. Wilker reclamou e Cidade disparou: “Vossa excelência já deu seu show hoje”.
Sinésio, que na discussão havia se manifestado contra o veto, saiu do plenário e apareceu depois da votação pendido que seu voto constasse na ata.
“Seu voto está mantido. Agora, eu não posso ficar esperando vocês saírem para resolverem os problemas de vocês e voltarem. Eu tenho que votar, senhor deputado”, disse Cidade.
Entre os defensores da manutenção do veto, além do líder do governo, Felipe Souza (Patriota), se manifestaram na sessão os deputados Belarmino Lins (PP), Saullo Vianna (PTB) e Doutor Gomes (PSC). Eles apontaram competência da União de se manifestar sobre o tema, conforme apontou parecer da PGE.
Em síntese, Wilker pediu a aprovação da matéria e que, se fosse considerada inconstitucional, posteriormente o Tribunal de Justiça do Amazonas (TJ-AM) poderia anulá-la. Ele afirmou que a intenção do Executivo é não perder arrecadação.
Entenda
A lei foi aprovada pela ALE-AM no dia 18 de agosto.
Na justificativa do projeto, o Wilker Barreto ressaltou que a Constituição Federal não autoriza a União, Estado ou Município a confiscar bem para pressionar pagamento de imposto.
“Em matéria de imposto, você não pode apreender bens para obrigar cobrança, salvo todo um projeto administrativo e judicial”, defendeu o deputado durante a votação da matéria. “Se essa moda pega, quanto tu tiver com atraso no IPTU tu não entra em casa”, completou Wilker.
Em nota técnica sobre o então projeto de lei, o Departamento Estadual de Trânsito do Amazonas (Detran-AM) apontou inconstitucionalidade da matéria.
Segundo o Detran-AM, “o dispositivo constitucional atribui como competência privativa da União legislar sobre matéria de trânsito”, ao citar o artigo 22 da CF.
“A pretensa norma tem por objetivo criar preceito impeditivo de conduta à autoridade de trânsito estadual, de modo a revogar no Amazonas, ainda que tacitamente, aregrado artigo 230,V do Código de Trânsito Brasileiro”, afirmou.
“Deste modo, caso aprovada, a pretensa norma atingirá negativamente a competência do artigo 230, V do Código de Trânsito Brasileiro, que prevê como infração de trânsito a condução de veículo, sem que esteja devidamente registrado e licenciado, cuja medida administrativa cabível é de remoção do veículo”, completou a nota.
Sobre as súmulas do STF, a nota técnica do Detran-AM “não detém natureza vinculante, logo não aplicavies ainda que para casos idênticos, fazem referências a regras de funcionamento de estabelecimento comercial, circulação de mercadorias e exercício de atividade profissional, respectivamente, e, de longe, guardam relação com circulação de veículos”.
O projeto, no entanto, foi aprovado.
“Como um veículo sem o IPVA pago é considerado não licenciado, o Código de Trânsito Brasileiro (CTB) prevê o caso como infração, com penalidade de multa e apreensão do veículo, por força do artigo 130, parágrafo 2º e do artigo 230, inciso V”, informou o órgão.
“A Constituição Federal concede à União a competência para legislar privativa sobre trânsito. Nenhuma lei distrital ou estadual consegue suprimir uma lei federal. Este projeto de lei, aprovado pela Assembleia Legislativa, possui vício de constitucionalidade”, acrescentou.
Em setembro, o governador Wilson Lima (PSC) encaminhou o veto à ALE-AM.
Na mensagem aos deputados, o governador reforçou os argumentos do Dentran-AM, inclui um parecer da Procuradoria Geral do Estado (PGE) e cita o posicionamento do Denatran sobre o tema, baseado em decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).
O parecer da PGE afirma que a lei estadual aprovada invade a competência federal de legislar sobre o trânsito. A procuradoria cita ainda a decisão do STF que reconheceu a constitucionalidade do CTB e que a apreensão não configuraria confisco, como defende o autor do projeto.