MANAUS – O juiz federal substituto da 4ª Vara da Justiça Federal no Amazonas, Luís Felipe Pimentel da Costa, inocentou o ex-secretário estadual de Fazenda, Afonso Lobo, do crime de falso testemunho, em uma das ações relacionadas à operação Maus Caminhos. A sentença foi publicada na segunda-feira (17).
A denúncia contra Afonso Lobo foi proposta pelo Ministério Público Federal (MPF) e aceita pela Justiça Federal em janeiro deste ano. Na ação, o MPF acusava o ex-secretário de prestar informações falsas sobre a movimentação de recursos públicos entre contas administradas pelo estado e as de empresas investigadas na Maus Caminhos.
A tese da defesa, aceita pelo juiz, é a de que Afonso Lobo foi convocado para depor na condição de testemunha, quando na verdade era alvo de outra linha de investigação do mesmo caso. Sendo assim, os advogados sustentaram que o cliente não pode ser acusado de prestar falso testemunho, uma vez que, como investigado, tinha o direto até de ficar em silêncio.
“Nessa ordem de ideias, não seria possível tomar seu compromisso de dizer a verdade, previsto no art. 203 do CPP, quando, na verdade, ele faria jus ao direito de não produzir prova contra si mesmo (nemo tenetur se detegere), podendo inclusive permanecer em silêncio”, escreve o juiz em um trecho da sentença, ao expor a tese da defesa.
Seguindo esta linha de raciocínio, Luíz Felipe inocentou Afonso Lobo não por ele ter falado ou não a verdade durante o depoimento, mas sim porque ele não poderia ter sido ouvido na condição de testemunha em um caso que posteriormente ficou provado que ele também era investigado.
“Não se trata de avaliar se as declarações do réu foram, ou não, falsas. Trata-se, na verdade, de reconhecer que as perguntas feitas quando do depoimento se ligavam diretamente a investigação em trâmite contra a testemunha, redundando, meses após, em denúncia pela prática do crime de organização criminosa, em conjunto com a parte que o arrolou como testemunha naquela ocasião (Mouhamad). E, nesse específico contexto fático, não resta materializado o crime do art. 342 do CP, por ausência da elementar do tipo ‘testemunha'”, escreveu o juiz.
Se tivesse sido condenado, Afonso Lobo poderia pegar de 2 a 4 anos de prisão.
O ex-titular da Sefaz foi preso preventivamente no final do ano passado, durante a operação Custo Político, que é um dos desdobramentos da Maus Caminhos. Ele é réu em outras ações resultantes do caso que também tramitam na 4ª Vara Federal.
Afonso Lobo é acusado pelo MPF de integrar o núcleo politico da organização criminosa que teria desviado mais de R$ 110 milhões de recursos da saúde. Ele alega inocência, e responde o processo em liberdade, monitorado por tornozeleira eletrônica./ L.P.
Abaixo, trecho final da sentença:
Ao contrário do que aduz o MPF em sede de réplica a fls. 612/613, entendo que não se pode interpretar o exercício do direito silêncio e da garantia de não se produzir prova contra si mesmo, no âmbito do processo penal, de acordo com os parâmetros do processo civil. Como demonstrado, tais princípios possuem base constitucional e convencional própria, constituindo o parâmetros de aplicação das normas infraconstitucionais. Dito de outro modo, se a Constituição e os Tratados de Direitos Humanos garantem ao réu o direito ao silêncio e de não produzir prova contra si mesmo no processo penal, não é o Código de Processo Civil que irá conduzir a interpretação diversa. Logo, assiste razão à defesa técnica na tese formulada na resposta à acusação a fls. 23/40, evidenciando-se que o fato narrado não constitui crime, caracterizando-se, com exatidão, a previsão contida no art. 397, III, do CPP, impondo-se a absolvição sumária do réu. Reputo prejudicadas as demais alegações e requerimentos apresentados pela defesa. III – DISPOSITIVO Ante o exposto, julgo IMPROCEDENTE o pedido formulado na denúncia pelo Ministério Público Federal e ABSOLVO sumariamente o réu AFONSO LOBO MORAES da imputação da prática do crime de falso testemunho, nos termos do art. 397, III, do Código de Processo Penal. Com o trânsito em julgado, oficie-se à Polícia Federal, para que proceda à baixa dos registros cartorários do absolvido, efetuando-se a consequente baixa na distribuição e arquivamento do feito. Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Manaus, 17 de setembro de 2018.
Luís Felipe Pimentel da Costa
Juiz Federal Substituto