MANAUS – Uma ação civil pública (ACP), ingressada na Justiça nesta terça-feira (21), pede que as escolas da rede privada de ensino sejam obrigadas a reduzir em até 35% o valor das mensalidades escolares durante o período de suspensão das aulas, em decorrência da pandemia da Covid-19.
A ACP foi apresentada pela Comissão de Defesa do Consumidor da Assembleia Legislativa do Estado do Amazonas (CDC/ALE-AM), Defensoria Pública do Estado (DPE-AM) e Ministério Público do Estado (MP-AM) contra o Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino Privado do Amazonas (Sinepe/AM) e mais 50 estabelecimentos da rede particular.
Além da redução no valor das mensalidades, a ação pede ainda a suspensão da cobrança de atividades extracurriculares (balé, natação, futebol, etc.) até o fim do isolamento social.
Conforme solicitação, as instituições particulares devem conceder desconto de 30% nas mensalidades de ensino fundamental e médio e de 35% para o ensino infantil.
O Sinepe/AM, por sua vez, defende a negociação individual e lançou, nesta semana, uma ouvidoria para intermediar diálogo das escolas com os pais sobre mensalidades e práticas pedagógicas durante este período.
A ACP é resultado de uma série de reuniões técnicas, audiência pública, debates e discussões em torno do assunto, com a participação de representantes dos órgãos de defesa do consumidor, do Sinepe/AM, de pais de alunos e de instituições privadas de ensino.
“Por meio de muitas discussões e diálogos, tentamos chegar a um consenso, no qual nem o consumidor e nem o estabelecimento fosse prejudicado. Infelizmente, faltou sensibilidade por parte das instituições, representada pelo Sinepe/AM. E, esgotados todos os recursos, os órgãos de defesa do consumidor tiveram de acionar a Justiça para assegurar os direitos do consumidor, sem gerar prejuízos aos professores e outros funcionários dos estabelecimentos”, afirmou o presidente da CDC/ALE-AM, deputado estadual João Luiz (Republicanos).
O defensor público Cristiano Pinheiro disse que, de acordo com a ação, as reduções não deverão ser cumulativos com eventuais descontos ofertados, como pagamento pontual e convênios. “Os descontos vão ocorrer de forma a garantir o equilíbrio econômico-financeiro de contrato e o funcionamento do próprio sistema educacional privado”, ressaltou.
Pinheiro também justificou a suspensão da cobrança das atividades extracurriculares. Segundo o defensor, todas essas aulas são presenciais, não podendo ser ministradas de forma remota. “Como são atividades práticas, não tem outra forma de serem ministradas. Logo, a cobrança dessas atividades deve ser suspensa”.
“Não ignoramos que a excepcionalidade e urgência da pandemia de Covid-19 ensejou, com a determinação da suspensão das atividades não essenciais, a adoção de medidas igualmente extraordinárias. Porém, há algumas particularidades que também devem ser observadas. A exemplo da questão do ensino infantil, que se destina às crianças de até cinco anos de idade e possui como objeto o desenvolvimento e acompanhamento da socialização. Nessa modalidade, justamente em razão do cunho meramente psicológico, social, interativo do ensino, é incompatível com instituição da modalidade à distância. É um fator que inviabiliza a prestação de serviços no período todo de suspensão das atividades presenciais”, afirma o defensor público Rafael Barbosa, que também atuou na elaboração da ação.
A ACP foi assinada pelo deputado João Luiz; pelos defensores públicos Cristiano Pinheiro e Rafael Barbosa, da 1ª Defensoria Pública de 1ª Instância Especializada em Atendimento ao Consumidor e da Defensoria Pública de 1ª Instância Especializada em Interesses Coletivos, respectivamente; e pela promotora Sheyla Andrade, titular da 81ª Promotoria de Defesa do Consumidor (Prodecon).
Prejuízos
Na avaliação de João Luiz, os consumidores assumiram os prejuízos decorrentes da pandemia. “Essa situação não é um cabo-de-guerra. Mas é fato que o consumidor não pode arcar com todo esse prejuízo e, como não houve sinalização por parte das instituições de ensino quanto à revisão de contratos, nossa única alternativa foi levar a questão à Justiça”, comentou o parlamentar.
“Nós queremos garantir o equilíbrio econômico-financeiro do contrato e o funcionamento do próprio sistema educacional privado”, acrescentou Christiano Pinheiro. Para ele, a não intervenção para o desconto pode gerar “inadimplência em cascata”, potencializando os prejuízos ocasionados pela pandemia.
Proposta de TAC
Ao todo, foram realizadas uma audiência pública e seis reuniões técnicas para discutir e tratar sobre o assunto. Inicialmente, os órgãos de defesa do consumidor propuseram a assinatura de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), o qual previa a suspensão da cobrança de multas e juros e a negociação de descontos no valor das mensalidades de escolas privadas, além da melhoria da qualidade do ensino remoto.
O TAC, segundo João Luiz, foi recusado por parte das instituições, representada pelo Sinepe/AM.
O outro lado
Em nota à imprensa, o Sinepe-AM anunciou o lançamento da Ouvidoria da Educação Particular do Amazonas, um canal de diálogo entre pais, alunos e representantes das escolas particulares, que se propõe a intermediar as negociações sobre mensalidades e práticas pedagógicas.
Para a presidente do Sinepe-AM, Elaine Saldanha, a iniciativa representa um pacto pela qualidade da educação, auxiliando na mobilização e promoção das ações pedagógicas na rede privada. A ouvidoria atenderá instituições associadas e não associadas ao sindicato.
“Buscamos, através da Ouvidoria, fortalecer a parceria que as famílias sempre tiveram com as instituições onde seus filhos estudam. Intermediar essa negociação será importante, pois cada instituição tem seus problemas específicos”, acrescenta a vice-presidente do Sinepe-AM, Laura Cristina.
A Ouvidoria da Educação Particular do Amazonas receberá as solicitações para encaminhá-las aos representantes financeiros e pedagógicos das instituições de ensino, acompanhando as providências e soluções, dando o respectivo retorno aos interessados. O canal funcionará de segunda a sexta-feira, das 8h às 17h, pelo WhatsApp (92) 9 8463-4660.
A ideia surgiu durante as discussões que a entidade tem participado, por conta da pandemia do Covid-19. O Sinepe-AM tem alertado que as negociações com relação às mensalidades devem ser feitas diretamente entre as escolas e os pais dos alunos, porque cada instituição tem um determinado porte e dificuldades específicas. Assim, a entidade se propôs a ajudar, evitando cortes bruscos, “que causem o fechamento de instituições e demissões de milhares de profissionais da educação”.
“Desde o início temos orientado que as instituições busquem manter um diálogo franco com os pais e alunos, negociando individualmente os descontos que devem ser concedidos, até como forma de fidelização nesse período delicado em que vive o País, mesmo sem esses empreendimentos obterem redução da maioria de seus custos operacionais que têm, entre eles, salários, tributos, materiais e custos de manutenção”, enfatiza Elaine Saldanha.
As instituições, justifica, são de diferentes portes e cada estabelecimento possui dificuldades específicas. “Não se pode definir um percentual linear, atingindo todos, indistintamente”, destaca a presidente do Sinepe-AM. Embora as aulas presenciais estejam suspensas no período, diz ela, as escolas estão funcionando, com professores e demais funcionários trabalhando, oferecendo atividades pedagógicas on-line, conforme estabelece a legislação.
Além disso, reforça Elaine Saldanha, no retorno às escolas, mesmo as que estão trabalhando remotamente terão de planejar aulas em dias não previamente previstos para composição dos conteúdos.
“Isso representará custo adicional. É preciso entender que um desconto acima da capacidade irá fazer falta lá adiante também”, detalhou, reforçando que as escolas estão fazendo todo o esforço possível para se manter funcionando e pagando em dia os seus profissionais.
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