MANAUS – Após reunião com o governador Wilson Lima (PSC) para falar sobre ações de combate à pandemia do novo coronavírus (Covid-19) no Amazonas, representantes do setor produtivo recuaram, na noite desta segunda-feira (30), do pedido de reabertura parcial dos estabelecimentos no Estado. A reunião durou mais de quatro horas.
Dos técnicos de saúde do governo eles ouviram, entre outras coisas que, sem as medidas de restrição na circulação, até 22 mil pessoas poderão precisar de leitos em Unidades de Terapia Intensiva (UTI) ao longo da epidemia no Amazonas.
Ficou acordado que a possibilidade do retorno gradual das atividades será discutida novamente daqui a 15 dias, quando poderá se ter melhor uma ideia do avanço da doença, ou seja, as medidas do governo de restrição serão prorrogadas por pelo menos mais duas semanas. Mas, as conversas sobre o cenário vão continuar acontecendo com regularidade.
“Tivemos duas constatações (na reunião). A primeira é que não dá para a gente liberar geral e voltar a vida normal no momento. O Governo do Estado já fez uma flexibilização para algumas atividades essenciais”, observou o presidente do Centro da Indústria do Estado do Amazonas (Cieam), Wilson Périco, ao ESTADO POLÍTICO.
Diante das projeções apresentadas pelos técnicos, o presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas de Manaus (CDL Manaus), Ralph Assayag, disse que o grupo resolveu recuar da proposta de reabertura parcial do comércio já nesta terça-feira, com a reabertura dos shoppings no dia 7 de abril.
“Só que foi nos mostrado pelos técnicos de saúde que deverá crescer muito o volume de infectados. A subida deve iniciar muito forte a partir do dia 15 (de abril) e nós no Amazonas não temos respiradores suficientes para um número muito grande de pacientes precisando desse equipamento. Por causa disso, nós resolvemos recuar, para ver até aonde nós podemos voltar a conversar”, descreveu Assayag ao site.
Após a reunião, em vídeo divulgado nas redes sociais, a presidente da Associação dos Empresário do Vieiralves (AEV), Adlinez Moreno, disse que foi explanada a maneira como o vírus tende a se comportar e que isso é extremamente preocupante.
“Nós chegamos aqui com a ideia de pedir a flexibilização do comércio, de voltar a funcionar, mas nós precisamos dar um passo atrás. Ninguém vai sair ileso, a questão econômica já é muito complicada e pode se complicar ainda mais, mas nós temos que preservar as nossas vidas, das nossas famílias e dos nossos colaboradores”, disse.
Os representates do setor produtivo se disseram sensíveis à questão da saúde pública e que têm somado esforços para assegurar o suporte de saúde a maior quantidade de pessoas. Périco informou que foi criado um comitê para discutir esses temas.
Assayag informou que existem duas empresas do Distrito Industrial de Manaus trabalhando para desenvolver respiradores. “Se os respiradores tiverem o retorno, se tiverem sucesso e se conseguirmos produzir pelo menos mil respiradores, aí há uma possibilidade da gente voltar a conversar de novo para abertura (das atividades econômicas)”, disse.
“A saúde entendeu o comércio, o comércio entendeu a saúde e todo mundo ajustou que se tenha cautela e vá fazendo por partes. Nós já estamos hoje com um número pequeno (de estabelecimentos) aberto, mais do que muitos estados que fecharam tudo. Estamos lutando e esperando que, quando chegar no pico (da pandemia no Amazonas), já tenhamos respiradores e a gente passe com menos mortes”, acrescentou Assayag.
Entre os temas que serão discutidos antes do retorno gradual da totalidade das atividades está o funcionamento de serviços que, ao longo da pandemia, tem se mostrado essenciais, como os cartórios, explicou o representante do comércio.
“Cartório, por exemplo, têm que abrir. Pessoas que morrem têm que ter sua certidão de óbito e não só isso, como há uma série de outras coisas. Então, o cartório será incluído (entre os essenciais) para poder abrir também”, exemplificou.
A reunião
Durante a reunião, o governador Wilson Lima anunciou que as medidas restritivas continuarão vigentes. “O decreto do Governo do Estado continua valendo e aqui nós montamos um comitê de representantes do governo e também do comércio e da indústria, para entender como é que a economia vai continuar funcionando no Estado do Amazonas e como é que faremos essa conciliação entre garantir empregos ou demitir o mínimo possível, conciliando com a proteção das pessoas”, disse.
Wilson Lima defendeu que a prioridade neste momento é a saúde, mas que o Estado estuda meios de recuperar a economia, alinhado com todos os setores produtivos.
“A vida das pessoas está em primeiro lugar e é isso que nós colocamos aqui e deixamos muito claro, disso nós não abrimos mão. Primeiro cuidamos da vida das pessoas, e depois entendemos como vamos caminhar com as atividades econômicas que são fundamentais. Nós estamos tomando medidas que são duras, não há nenhuma decisão fácil neste momento, mas elas são importantíssimas e devem ser tomadas, de forma muito responsável”, destacou ele, ao ressaltar que todas as determinações seguem orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS), Ministério da Saúde e órgãos estaduais de Saúde.
O secretário estadual de Saúde (Susam), Rodrigo Tobias, disse que o sistema de saúde do Amazonas, assim como em qualquer outro lugar do mundo, não está preparado para uma explosão de casos do novo coronavírus, se todos adoecerem num curto espaço de tempo.
Tobias apresentou projeções feitas pela Susam as quais mostram que o isolamento social pode reduzir em 31% o número de infectados em Manaus e Região Metropolitana.
O mesmo estudo mostra que, sem a medida de restrição de circulação de pessoas, 22 mil pessoas poderão precisar de UTI. Se isso acontecer num curto espaço de tempo, aumentaria a possibilidade de óbitos já que o sistema de saúde não suportaria a demanda.
A diretora-presidente da Fundação de Vigilância em Saúde (FVS), Rosemary Costa Pinto, destacou que neste início da epidemia no Estado poucos casos positivos têm mais de 60 anos e a população mais atingida pelo novo coronavírus está na faixa-etária de 30 a 49 anos. “A nossa força de trabalho é que está sendo atingida, não são os idosos nem as crianças”, disse.
O médico e pesquisador da Fundação de Medicina Tropical do Amazonas e da Fiocruz, Marcus Lacerda, que conduz pesquisa do uso da cloroquina no tratamento da Covid-19 no Estado, ressaltou que a maioria das pessoas será contagiada pelo vírus mas é necessário que seja de forma lenta, daí a necessidade da redução do contato entre pessoas.
Além do Executivo estadual, participaram da reunião representantes da Assembleia Legislativa do Estado (ALE-AM), Tribunal de Justiça do Amazonas (TJ-AM), ministérios públicos do Amazonas e Federal (MP-AM e MPF), da Defensoria Pública (DPE-AM), Tribunal de Contas do Estado (TCE-AM) e Ministério Público do Trabalho (MPT).
Do setor produtivo, além do Cieam, CDL Manaus e AEV, também estiveram no encontro representantes da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes; Associação Comercial do Amazonas (ACA); Associação dos Notários e Registradores do Estado do Amazonas; Associação das Empresas do Mercado Imobiliário do Amazonas; Conselho Regional de Corretores de Imóveis do Estado do Amazonas, Conselho de Desenvolvimento Econômico, Sustentável e Estratégico de Manaus; Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas do Amazonas (FCDL); Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado do Amazonas (Fecomércio); Federação das Indústrias do Estado do Amazonas (Fieam); e Rede das Imobiliárias de Manaus.