Por Agência Brasil|
A diferença de acesso da população preta e parda a equipamentos culturais está diretamente relacionada com o retrato das regiões do país. No Sul e Sudeste, onde a maioria da população é branca, há maior concentração de bens culturais. No Norte e Nordeste do país, onde a maioria da população é preta e parda, o número de equipamentos culturais é reduzido, segundo dados da quarta edição do Sistema de Informações e Indicadores Culturais (SIIC), divulgado hoje (5) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica (IBGE).
Exemplo dessa desigualdade está no acesso às salas de cinema. De acordo com a pesquisa, a população preta ou parda tem menor acesso potencial a esses equipamentos culturais. Enquanto 44% dos pretos ou pardos moravam em municípios sem cinema, esse número em relação aos brancos era de 34,8%.
Pesquisador do instituto, Leonardo Athias, destacou que a desigualdade regional reflete a desigualdade racial. Segundo ele, o cinema é um dos equipamentos culturais mais concentrados. Apenas 10% dos municípios brasileiros têm salas para exibição de filmes. Para o pesquisador, a concentração das salas em determinados municípios, principalmente capitais, acirra o desequilíbrio no acesso à cultura.
Internet
Athias ainda destacou o aumento do acesso à internet e do uso de mensagens instantâneas, enquanto e-mails vem sendo menos utilizados pela população. “Tem o acesso a vídeos, filmes e séries pela internet, o que leva a crer que tem tido aumento da fruição a partir disso”, disse.
Para o pesquisador, não há como comparar o gasto com cultura com os gastos essenciais. “No mundo todo tem uma estrutura de gastos que se ocupa mais por alimentação. Entre uma Pesquisa de Orçamento Familiar e outra a gente viu o aumento da importância do transporte. Isso pode estar levando a uma diminuição, a um teto de gastos nas famílias. As tecnologias mudam e os gastos também, mas parece que em um pouco menos de 8% dos gastos familiares [com cultura], próximo aos gastos com saúde que são 8%, me parece relevante para a cultura”, completou.
Em relação às ocupações, o SIIC apontou aumento de ocupação informal no setor cultural em relação a outros setores. Em 2014, os empregados com carteira assinada neste segmento representavam 45% dos trabalhadores, enquanto em 2018 esse contingente caiu para 34,6%. A parcela de pessoas que trabalham por conta própria passou de 32,5% para 44%. “Teve uma evolução desvantajosa. Algumas áreas foram mais afetadas. A gente teve diminuição no comércio de equipamentos eletrônicos e de áudio e vídeo. A edição também perdeu trabalhos formais. Ocupações que tiveram nível de formalidade maior tiveram impacto, alguns tipos de artesãos e de marceneiros que perderam o status de formalidade. Bateu no mercado como um todo e bateu na cultura”, afirmou.
Salário das mulheres
Em relação ao salário por gênero, o pesquisador destacou que no setor cultural, com concentração de profissionais mais qualificados do que a média do mercado, a diferença de ganhos é maior. De 2014 para 2018, a participação feminina passou de 47,6% para 50,5%, mas o rendimento médio foi de R$ 1.805 contra R$ 2.586, dos homens.
Um trabalhador básico vai ganhar um salário-mínimo, seja homem ou mulher, já nas ocupações com mais qualificações há mais caminhos para ter desigualdades, que são fenômenos de segregação que é ter mulheres em ocupações, que pagam menos que aos homens, além do próprio fenômeno da discriminação, que é pagar menos para profissionais com a mesma qualificação e na mesma ocupação por diferentes razões ou por que é mulher ou porque é preta ou parda”, afirmou Athias.
Índice de preços
Esta é a primeira vez que o SIIC divulga o Índice de Preços da Cultura (IPCult). Leonardo Athias lembrou que o IBGE tem tradição de trabalhar índices de serviços específicos. “Os índices de preços mostram tanto a oferta e a demanda no tempo, como nesse recorte de 2012 a 2018, como também no potencial maior ou menor no acesso em função dessa evolução de preços”, disse.
A telefonia teve uma queda de preços nos últimos anos, assim como os televisores. “Isso é um bom sinal, porque parece que dá mais acesso. A gente busca, às vezes, os mocinhos e os vilões da inflação inclusive para ter uma ideia de como se pode dar mais acesso. O Índice da Cultura pode ser também um balizador para os agentes econômicos, como se usa o IPCA para os contratos. Até que ponto, este índice não pode ser até mais interessante para diferentes usos que se pode fazer com o índice de preços?”, afirmou o pesquisador.