MANAUS – Para livrar Alejandro Valeiko da prisão temporária em uma delegacia, a desembargadora do Tribunal de Justiça do Amazonas (TJ-AM) Joana Meireles teve que encontrar uma brecha na legislação para analisar o que sequer foi levado à instância inferior.
Na análise do pedido dos advogados do filho da primeira-dama de Manaus (Elisabeth Valeiko), Joana admite que não poderia reconhecer o habeas corpus pleiteado, uma vez que a defesa não havia feito antes pedido semelhante à 1ª instância.
Por essa razão, na decisão, Joana escreve que não é possível reconhecer o habeas corpus para revogar a prisão temporária. Isso porque este instrumento jurídico só deveria ser levado à 2ª instância se antes tivesse sido negado pela 1ª instância, o que não se tem notícia de que tenha acontecido.
Quando isso não acontece, pode-se dizer que houve “supressão de instância”, que é uma irregularidade processual que acontece quando a instância superior decide uma questão não examinada pela instância inferior.
O “no entanto”
No entanto, a desembargadora aponta na decisão uma legislação que permite a um magistrado derrubar a decisão de uma instância superior por iniciativa própria, sem que isso seja considerado “supressão de instância”.
“No entanto, tendo em vista as relevantes informações trazidas à este Juízo acerca de doenças psiquiátricas que acometem o paciente, entendo ser o caso de concessão da ordem liminar em caráter ex-ofício, conforme autoriza o Código de Processo Penal (sic)”, escreve a magistrada em um trecho.
Joana se refere ao art. 654 do Código de Processo Penal: “(…) 2º Os juízes e os tribunais têm competência para expedir de ofício ordem de habeas corpus, quando no curso de processo verificarem que alguém sofre ou está na iminência de sofrer coação ilegal”.
Para a desembargadora, Alejandro ser preso em uma delegacia é “coação ilegal”. Ela foi convencida disso pelas informações que os advogados do filho da primeira-dama lhe deram no pedido de habeas corpus.
Entre as alegações dos advogados, está a de que o cliente sofre de transtornos mentais causados pelo uso de cocaína. Acrescentaram ainda informações de um médico que atesta o estado de saúde instável de Alejandro.
Crente na veracidade do que a defesa de Alejandro a informou no pedido de prisão domiciliar, Joana acrescenta: Alejandro pode ter “um novo surto” se for preso assim que colocar os pés no aeroporto de Manaus.
“De igual forma, a presença em massa da imprensa, fazendo-lhe diversos questionamentos, seria ainda mais prejudicial à sua saúde”, escreve a desembargadora, completando: “Logo, defiro a liminar ex-ofício, no sentido de conceder o prazo de 24 horas para que o paciente Alejandro Molina Valeiko se apresente para a autoridade policial responsável pelo caso, na Delegacia Especializada em Homicídios de Manaus, para cooperar com as investigações”.
Na decisão, a magistrada ressalta que se Alejandro não comparecer à delegacia no prazo definido, a prisão domiciliar será revogada.
Alejandro é suspeito de autoria ou participação na morte do engenheiro Flávio Rodrigues.
Flávio foi visto pela última vez no domingo (29), na casa de Alejandro. Na segunda-feira (30), o corpo dele foi encontrado em um terreno no bairro Tarumã, também na zona Oeste, com perfurações causadas por arma branca.
A polícia trabalha com a hipótese de que Flávio foi morto na casa de Alejandro.
Os suspeitos alegam que o engenheiro foi levado da residência por homens encapuzados.
Segundo a polícia, um dos suspeitos presos já teria assumido a autoria do crime. Mas o nome não foi revelado.
Alejandro é considerado foragido desde quinta-feira (3). De todos os suspeitos, o filho da primeira-dama de Manaus é o único que a Polícia Civil do Amazonas não localizou. Cinco pessoas estão presas.
Desde sexta-feira (4) a polícia diz que a defesa de Alejandro promete que ele irá se entregar, o que não aconteceu até aqui. À Justiça, os advogados informaram que o cliente está no Rio de Janeiro, em uma clínica de reabilitação.
Na noite do crime (domingo, 29), Alejandro dava uma festa privada para os amigos, no condomínio Passaredo, no bairro Ponta Negra, zona Oeste de Manaus. Informações da polícia no inquérito dão conta de que a reunião era regada a drogas e álcool.
Os advogados de Alejandro emitiram um nota na tarde deste domingo (6) sobre a decisão que conseguiram com a desembargadora:
Recebemos, às 13h deste domingo, a decisão Nº 214/2018, da desembargadora Plantonista do TJAM, referente a processo que tramita em segredo de Justiça. O documento acata o pedido de prisão domiciliar requerido para Alejandro Molina Valeiko. O pedido foi fundamentado na necessidade de tratamento médico do paciente, que, de acordo com laudos médicos, sofre de transtornos mentais e comportamentais devido ao uso de entorpecentes; transtorno esquizofrênico e de personalidade dissocial. Alejandro cumprirá a decisão judicial no prazo determinado pela desembargadora. A defesa reitera que ele já esteve na delegacia logo após o ocorrido para prestar esclarecimentos. Fez exame de corpo de delito e colaborou com as investigações. A defesa espera que tudo seja esclarecido com brevidade e com a imparcialidade profissional que qualquer investigação necessita.
A nota é assinada por Yuri Dantas e Marco Aurélio Choy.